Broken Hearts #32


Yori andava devagar até a cozinha, sabia que era vampiro, sabia que era forte, mas ainda tinha um pouco de agonia daquela barriga volumosa dos cinco meses de gravidez, não era muito, mas o suficiente para ter medo pela filha. 
- Ophelia! Hideki já chegou? Ele disse que ia buscar algumas coisas do trabalho, mas já fazem algumas horas... 
Conforme chegou na sala, viu os cabelos loiros no chão, eram de Ophelia? Arregalou os olhos conforme olhou sobre o sofá e viu seu corpo desfalecido, teria ido para perto dela, se não houvesse um vampiro bem maior olhando para si a seu lado. Os cabelos negros deslizavam por seus ombros gentilmente, os olhos amarelos tinham um vermelho vivo, recém alimentado. Arregalou os olhos.
- Quem... Quem é você?
- Você é outro serviçal que vai tentar me impedir de entrar?
- O que? Eu... Eu não...
Yori fungou sutilmente e sentiu o cheiro dele, era o mesmo cheiro que o de Hideki, por isso estava tão confuso. 
- Essa casa é minha, você não vai me expulsar.
- Sua? Essa casa é do Hideki. 
- E quem você acha que colocou ele no mundo, garoto?
- O senhor não tinha morrido?
- Foi isso que ele falou de mim? - Ele riu num sopro nasal. 
- Pelo menos foi o que eu imaginei... Ele disse que você foi embora. 
- Eu disse a ele que voltaria. 
- Há anos. 
- Mas voltei, não voltei? 
Yori uniu as sobrancelhas, estava com medo.
- ... Ele vai voltar logo. 
- Hum, receio que você vá correr para o quarto, não vai? 
- Não... Eu não...
Hideki havia levado um tempo para voltar, mas estava prestes a ir, não porque tudo estava nos conformes, mas porque sentiu uma estranha aflição, vinha de Yori, e claro, imaginou todas as razões pelas quais ele podia sentir aquilo, talvez, ir embora mas sentir medo de que o encontrasse? Bom, já havia passado dessa fase, ou quase. Incomodado, num salto praticamente já estava lá, sentia um cheiro no ar, de algum modo conhecido e ainda nunca sentido ou talvez vagamente se lembrasse.
- Yori! - Chamou, não gritou, mas era firme e bem audível.
Yori virou-se em direção a porta conforme ouviu e caminhou em passos firmes até ele, se escondendo atrás de seu corpo que parecia uma muralha em frente a seu pai.
- Hideki... Você cresceu bastante.
Hideki olhou para o homem em frente, soube quem ele era, soube exatamente mesmo que não se lembrasse de seu rosto depois de tantos anos, quer dizer, tinha ideia dos traços, mas não com a exatidão. Ainda assim, fingiu não saber.
- E quem é você?
- É lógico que eu sou seu pai.
Disse ele erguendo o corpo de Ophelia como se fosse um urso de pelúcia a colocar sobre o sofá, e embora ainda tivesse facilidade, tinha cuidado, de alguma forma estranha com o corpo dela.
- Meu pai? Achei que estivesse morto. - Hideki disse e tocou os cabelos de Yori. - Você pode cuidar da Ophelia pra mim?
Yori assentiu e devagar seguiu para a cozinha, onde pegaria o sangue.
- O garoto é seu?
- É meu parceiro. O que precisa?
- Hum, eu voltei pra ficar com vocês, queria ver o meu filho, só não esperava encontrar você já acompanhado. Mas pelo menos a casa ainda é minha.
- Bem, tem razão, a casa é sua, então pode ficar com ela se tiver a intenção. Eu posso me mudar com Yori, afinal, já não sou uma criança como você viu a última vez.
- Hum, você não quer morar com o seu pai?
- E por que eu iria querer? Eu cresci sem você.
- Você sabe porque eu fui embora, Hideki. - Ele se aproximou em pequenos passos até o outro e segurou em seu queixo. - Você tem os olhos da sua mãe.
- Eu não sei. O que eu sei é que você não queria ser pai, e bem, conseguiu não ser um.
Teria se afastado, mas não fez, se tinha os olhos da própria mãe, faria questão de olhar para ele, faze-lo sentir o peso dos olhos dele. 
Ele suspirou e assentiu, afastando-se num pequeno sorriso. Eu achei que iria encontrar o mesmo bebê confuso que era quando o deixei aqui, pelo visto, aprendeu muita coisa. Aquela humana estragou você.
- Me estragou? O que quer dizer com isso? Aquela humana foi minha família.
- Eu sou sua família mais do que a Ophelia é. 
- Tsc. - Hideki resmungou, risonho. - Ela não fez nada, você quem fez.
Ele deu um pequeno sorriso.
- Eu voltei porque senti sua falta, Hideki.
- Você sentiu falta de um estranho? Que inusitado.
- Você não é estranho, é meu sangue. E agora que eu sei que vou ser avô eu quero ficar.
- Claro. 
Hideki disse e limitou a conversa, não adiantava continuar com aquilo e nem mesmo conseguia acreditar nele, em sua cara de pau. Não disse nada, sumiria em algum momento, depois que achasse uma casa para morar e iria sem dizer nada, como ele fez. 
- Hideki... - Ele disse e o segurou em seu braço. - Eu sou seu pai, mas sei que não me quer aqui. Ficarei por uns dias, depois eu vou embora.
- Por que quer ser pai agora?
Ele sorriu meio de canto.
- Bem... Você sabe que eu nunca consegui sentir o amor que sua mãe sentia por mim, mas o que nós passamos não foi realmente ruim, eu voltei pra te ver porque achei que pudesse entender o porquê eu não sentia o mesmo sentindo o seu cheiro, já que tem o mesmo cheiro dele... Mas aí eu vi o homem que você se tornou e fiquei orgulhoso, então quis fazer parte da sua família.
- Bem, se queria descobrir isso a partir do cheiro, então acaba de esclarecer porque foi embora.
- Bem, provavelmente foi por isso mesmo.
- É, porque não foi capaz de amar seu filho como não foi capaz de amar ele. De todo modo, a casa é sua.
Ele assentiu.
- Onde estão os criados? Só sobrou Ophelia?
- Já não se lembra que foi o que deixou? Apenas Ophelia e eu.
- Não me lembro. Vou até a cidade pegar alguns serviçais.
Hideki olhou para ele e não respondeu mais, aquele era um assunto trivial, uma razão estúpida para conversar, sua tentativa de puxar assunto, não sabia o que ele queria e nem sabia se sentia alguma coisa em relação a situação. Dadas as costas apenas seguiu até o cômodo onde Yori ajudava a serviçal.
- Hideki... - Yori disse a se virar para ele, Ophelia já estava acordada, embora fraca. - Ela está melhor, estou dando sangue pra ela. Ele já foi?
- Não, ele pretende ficar. A casa é dele de todo modo. Em breve encontrarei outra casa.
- Nós... Vamos ter que sair? Mas... O quarto do bebê...
- Eu posso fazer outro quarto. Dinheiro não é um problema.
- Ah, mas... - Yori disse e uniu as sobrancelhas. - Você... Fez com tanto carinho...
- Mas agora ele quer fingir que é pai!
Yori uniu as sobrancelhas novamente e deu dois passos para trás, assustado com o tom de voz dele.
- Não estou brigando com você...
Hideki disse, aborrecido com sua reação, embora ele não tivesse mesmo culpa por seu reflexo. Yori a
ssentiu, sentindo as lágrimas nos olhos ao pensar no quarto que haviam feito, estava grávido, por isso estava emotivo, e sabia que podia irrita-lo, mas não tinha culpa. 
- Ophelia, está melhor?
- Sim, Yori-chan... Estou um pouco melhor, obrigada. Eu vou para meu quarto, pra vocês poderem resolver.
- Por que está chorando? 
Hideki perguntou, não era entendido de seus sentimentos durante a gravidez, no mais, estava lidando com uma sensação esquisita a respeito daquela "visita".
Yori negativou a ele conforme sua pergunta e assentiu a ela somente, o cheiro do vampiro mais velho estava disperso, ele havia saído.
- Hum. Descanse por hoje. Se sente segura com ele?
Hideki indagou a ela, embora fosse normalmente seco na interação, ela sabia que lhe dava seu valor. Após a saída dela no entanto, se voltou para o menor.
- Me fale.
Ela assentiu, de uma forma que não parecia muito cética do que dizia, tinha seu medo sim. Desviou o olhar a ele quando a viu sair e negativou.
- Eu só... Não é nada, eu só não queria me mudar.
- Por quê? Eu posso te dar uma casa tão boa quanto essa.
- Eu sei, mas... Eu... Eu vi o quanto você estava animado pintando as paredes do quarto com seu rosto cheio de tinta... Eu vi você escolher os detalhes dos desenhos da porta, mas tudo bem...
- Então o que eu deveria fazer? Ganhar um pai de repente? - Hideki sorriu, ingracioso na verdade.
- Não foi isso que eu disse...
- Então me diz o que fazer.
Yori uniu as sobrancelhas e desviou o olhar dele.
- Eu não... Não sei.
Hideki seguiu até uma cadeira próxima e então se sentou. Fechou os olhos, era um tolo.
- Vamos mata-lo. 
Yori disse, não que estivesse falando sério, quer dizer, talvez estivesse.
- Não, ele ainda é mais forte que eu e.. Sou um homem tolo, que pode ser enganado por ele.
- ... Acha que ele está dizendo a verdade?
- Não acho, e ainda assim acredito.
- Hum... Ele é um cretino.
- Bem, foda-se, que ele faça como quiser.
Yori assentiu e caminhou até ele, tocou seu rosto e acariciou.
- Eu vou com você pra onde quiser ir.
Hideki olhou para ele, pronto para refutar o fato de que a pouco havia dito o contrário, no entanto, apenas ergueu o olhar para seu rosto e deitou a face em sua mão. O loiro acariciou seu rosto e abaixou-se, selando seus lábios.
- Tudo bem, fazemos outro quarto.
- Você quer conhecer ele?
- Não... Não tenho vontade.
- É, eu.. Eu não quero pensar mais.
- Tá bem... Vamos sair? Quer dar uma volta comigo? Ou quer ir para o quarto?
- Hum, vamos para o quarto. Eu não sei, o que você quer fazer?
- Te distrair, quer fazer amor comigo?
- Eu sempre quero você, mas eu não sei se consigo parar de pensar nisso.
Yori uniu as sobrancelhas.
- Eu nunca vi você tão chateado...
Murmurou e se aproximou, selou os lábios dele.
- O que você faria? Você entende?
- É, eu entendo... Sabe... Podemos ficar no meu apartamento enquanto isso, eu limpo tudo.
- Não, eu consigo uma casa rapidamente. Eu só... Você não queria ir embora.
- Eu não quero, mas... Não quero que você fique triste...
- Hideki. - Disse o homem, abrindo a porta. - Eu trouxe o jantar.
- Eu estou irritado, não estou triste.
Hideki disse, interrompido no entanto ao ouvir a porta ser aberta. Deu uma risadinha ao ouvir o comentário vir do outro cômodo.
O homem entrou na cozinha, carregando o corpo em seu braço e jogou no chão, era um adolescente, Yori arregalou os olhos ao perceber que era um pouco mais jovem do que a si.
- O que é isso?!
A medida em que ele adentrou a cozinha, Hideki olhou para o corpo que jogou ao chão. Viu o jovem que ainda tinha a pele corada, havia sido morto recentemente.
- Por que trouxe isso aqui?
- Ora, isso é o jantar. 
- Não, não... Não pode matar crianças! 
- Por que não? A carne é mais macia.
- Nem tente explicar, ele não se importa com criança alguma. Eu não trago corpos para casa. E eu não preciso que você busque o jantar, eu consigo fazer isso, sabe, já tenho cem anos nesse mundo de merda.
Ele deu um sorriso.
- Não traz corpos pra casa? Você é um vampiro.
- Mas não é por isso que eu gosto de bagunçar a minha casa.
- É só limpar, mocinha. 
Yori uniu as sobrancelhas.
- Hey! Não chame ele assim! 
- E o outro parece um pinscher.
Hideki levava corpos, levava algum alimento, mas certamente diria para contraria-lo.
- Deixe.
Disse ao moreno e negativou num sorrisinho, indiferente. Claro que estava querendo discutir, mas não queria mostrar isso a ele.
- Você pode jantar isso se quiser.
- Hum, você não parece meu filho, tem medo de um corpo?
- Já chega, você não devia morar aqui. Você não devia voltar nunca mais! Você abandonou o Hideki, você deixou seu esposo morrer, você é um lixo, não pode ser considerado um vampiro, você é um saco de ossos só esperando o vento te levar embora. Acabou a diversão por aí e quis vir até aqui irritar o Hideki? Pois você pode ir embora! Você nunca viveu nessa casa, ela não é mais sua, temos um quarto para o nosso filho, e tenho certeza que o Hideki vai trata-lo melhor do que esse projeto de pai que você acha que é. Agora pegue esse corpo imundo que você trouxe, e tire do chão da cozinha que eu limpei meia hora atrás! 
Ele arregalou os olhos conforme ouvia o garoto gritar com ele, se admirava como um pequeno garoto como aquele não tinha escrúpulos em gritar com um vampiro de duzentos anos.
- Você não tem medo de morrer garoto?
Ele perguntou, mas estava mais curioso, ele não parecia do tipo ameaçador ou provocativo de fato, estava apenas tentando descontrair de alguma forma, tentava não levar aquele assunto tão a sério, ou escondia algo bem no fundo daquele sorriso falso.
- Não, eu tenho medo de dormir e sonhar que você é meu pai!
Ele deu um pequeno sorriso, Hideki parecia silencioso e percebeu que não haveria muita conversa ali. Assentiu somente e pegou o corpo com facilidade, seguindo para fora da cozinha, iria embora.
Hideki ouviu tudo o que ele estava dizer. De algum modo se emputeceu porque dissera para que ficasse quieto, que deixasse para lá, além do mais, não era incapaz de se defender, no entanto, tentou processar, assim como a força de vontade que vinha tendo para ficar em silêncio, ele estava se incomodando no lugar de si, estava tomando as "dores", era porque se importava. Ergueu a mão e tocou e tocou o topo de sua cabeça.
- Tudo bem. Eu não me importo com isso. - Se virou e voltou a atenção ao moreno, dadas as costas para si. - Me fale a verdade, Hideaki, o que você quer de mim? O que estava esperando?
Ele deu um sorrisinho novamente.
- Estou saindo, não se preocupe. Não quero nada de você.
- Eu quero saber. Quero saber o que faz você voltar aqui cem anos depois. Curiosidade? Solidão?
- Eu não tenho mais ninguém no mundo, então achei que seria bom ver meu filho de novo, mas nem ele me quer por perto então eu irei embora.
- Voltou por que eu fui o que sobrou?
Hideaki ficou em silêncio por um momento, tentando pensar numa resposta. O riso de Hideki soou num sopro nasal.
- Você nem tenta fingir que não.
- Eu tentei, mas não deu muito certo. Eu estou me despedindo de toda forma, a casa é sua. Adeus, Hideki.
- Antes disso, deve saber, ninguém te quer por perto porque você é odioso, só se importa com o que você sente, se é que sente alguma coisa, afinal, todas as pessoas das quais você podia ter algum sentimento de verdade, você só deixou restar ou ódio ou indiferença. Foi incapaz de amar até a única pessoa que provavelmente ignorou toda a sua falta de caráter, que foi a minha mãe, porque né, nem o filho pode te dar isso agora. Veja se com os anos encontra algum otário que te faça sofrer como minha mãe sofreu.
Ele sorriu e negativou, tentou engolir as palavras que havia escutado, mas pararam na garganta de uma forma difícil de tragar, talvez ele estivesse certo.
- Não vai me ver novamente. Espero que tenha uma filha bonita, filho.
- Não, você pode vir quando quiser. Venha conhecer a sua neta, talvez você aprenda comigo o que é ser um bom pai.
- Não pretendo viver além dessa noite. Não virei visitar minha neta.
- Que porra é essa?
- É, você ouviu. Vou me juntar a sua mãe. Duzentos anos é muito tempo, descobri que não amo ninguém e só faço as pessoas sofreram, não há mais nada para mim nesse mundo.
- Você não sente nada?
- Acha que não me arrependo das coisas que eu fiz? Eu me arrependo sim. Mas eu continuo sendo um babaca, não continuo?
- Eu não perguntei isso. Perguntei se você não sente porra nenhuma, caralho.
- Eu sinto sim, é isso que você quer ouvir? Você acha que me conhece, mas você também não sabe nada sobre mim.
- Eu quero que você seja sincero, seu filho da puta. Porque você só consegue falar merda.
Hideaki sorriu de canto, totalmente desprovido de graça e negativou, guiou o pulso aos lábios e mordeu, abrindo um pequeno buraco, só então levou para ele.
- Beba. Vai saber se eu estou mentindo.
- Não quero isso, não quero seu sangue. Eu só queria entender o que diz, porque você se contradiz o tempo todo. Parece que quer abrir a boca pra falar algo e seu cérebro não processa o que deveria sair dela. Mas o pior, é que eu quero que você fique, seu merda, porque diferente de você, eu tenho pena de te jogar de escanteio e ir viver minha vida, embora você merecesse porque fez isso comigo.
- Eu quero estar com você Hideki, eu quero de verdade, e eu sinto muito... Eu... Não devia ter feito o que fiz, não devia ter deixado você.
Ele disse e uniu as sobrancelhas, estava confuso, geralmente era muito altivo, não era sentimental, por isso as palavras ficavam presas na garganta.
- Eu... Eu não conseguia olhar pros seus olhos e pensar nele. Não conseguia...
- E por que? Já que você nem sequer quis ficar com ele.
- Por isso mesmo, porque eu me sentia culpado toda vez que olhava pra você. Não é que... Você não sabe a história, você não sabe a história toda.
Hideki ficou quieto, não sabia o que dizer na verdade. Estava se sentindo louco. Hideaki suspirou e deixou o corpo no chão. 
- Eu conheci sua mãe num bordel, é claro que não era um lugar bom para encontrar um vampiro nascido, quase todos eram transformados, mas ele não, ele era um rapaz gentil e talentoso, dançava muito bem, era elegante e cheirava a cerejeiras, ele me contou uma história dizendo que fugiu de sua casa porque seus pais queriam obriga-lo a se casar com sua prima, e ele não era heterossexual, ele me disse que tinha nojo dela. Eu fiquei com ele todas as noites em que fui para o bordel, não queria outro garoto, eu gostava da companhia dele, mas como todos os garotos, ele tinha que seguir as regras da casa, eu não podia beija-lo, não podia fazer certas coisas... E um dia, ele me segurou junto dele, não me deixou eu me afastar, e como ele era mais velho do que eu, eu não consegui me desvencilhar dele. Um mês depois, ele me disse que estava esperando um filho meu. Eu disse pra ele, várias e várias vezes que não sentia nada por ele, que ele era somente uma companhia, mas ele insistia em ficar comigo, disse que eu era o Akai Ito dele e que não poderia viver sem mim. Eu o comprei, o tirei de lá, o levei pra minha casa, pra essa casa. Eu deixei que ele vivesse aqui esperando que eu fosse sentir o mesmo por ele, esperando que um dia eu fosse entender o que era aquele sentimento, mas eu não sentia, não importava o quanto eu estava perto dele, eu não sentia, e ele sabia, ele insistia em beber do meu sangue, ele insistia em saber dos meus sentimentos, ele insistia em saber o tempo todo se eu o queria, e eu não podia mentir pra mim mesmo. Eu disse a ele que eu iria ficar, ainda que não sentisse o mesmo, ainda que soubesse que ele não era o meu Akai Ito e ele ficou doente. Eu saía pra trabalhar, ele achava que eu tinha um amante, eu ia até a cidade e ele achava que eu estava no bordel, ele cheirava minhas roupas, um dia ficou tão cego que arranhou o meu rosto, e eu segurava os braços dele, pedindo que ele se acalmasse, e eu dizia que o amava, mas eu não sentia o amor dele, não como ele. Eu vivia machucado, tentando de alguma forma controlar os sentimentos dele, porque preferia estar machucado do que ver ele sofrendo. Eu tentei tanto, Hideki, eu tentei de um jeito que você não faz a menor ideia, você não poderia fazer. Um dia eu percebi que tinha sangue na cama, nos lençóis, eram pequenas gotas, ele estava se machucando, vampiros não adoecem fisicamente, mas ele parecia doente da cabeça, ele parecia estar ficando louco. Enquanto eu estava no trabalho, eu ficava pensando no que ele estava fazendo, porque depois de um tempo, tudo que eu sentia era angústia, tristeza, solidão, não sentia mais nada além disso vindo dele, até que um dia eu não senti mais nada. Pensei que ele pudesse estar dormindo, mas eu corri pra casa já que havia sido tão repentino e procurei na casa toda, não tinha nem sinal dele, não o encontrava, achei que ele pudesse ter saído, ter sumido. Mas aí eu saí até o jardim e vi o fogo, ele ateou fogo no jardim, e em si mesmo também. Quando eu entrei, você chorava no andar de cima e eu não sabia o que fazer, eu era muito novo, eu... Eu não sabia nem segurar você no colo. Ophelia parecia cuidar melhor de você do que eu, foi aí que eu a deixei com você, sabia que ela poderia cuidar bem melhor do que eu. Eu fui um cretino, eu sei que eu fui e sei que ainda sou. Só que você não sabe como foi, você sabe o que contaram pra você.
Hideaki tinha lágrimas nos olhos, mas mesmo ele, estava manipulando a história de alguma forma, não havia acontecido exatamente assim, mas as partes que ele havia ocultado, talvez fossem melhores se não fossem ouvidas nunca mais, ele não precisava saber delas, quem precisava estava em outro lugar. 
Hideki ouviu tudo o que tinha para contar, não sabia exatamente qual sentimento ter por aquilo, no entanto, suas palavras vinham como um filme na cabeça, podia imaginar e não era algo prazeroso de se assistir.
- É, eu não sei, nem me contaram, porque não ficou ninguém aqui pra dizer coisa alguma. E eu até entendo, só não entendo porque demorou cem anos para vir me dizer o que de fato aconteceu.
- Você acha que eu teria coragem de olhar no seu rosto depois de ter abandonado você? Eu vim até aqui porque eu senti que minha vida tinha acabado, e você merecia saber.
- E ainda mais egoísta você vir pra dizer que vai se matar depois de não ter dado satisfação sobre nada na sua vida.
Hideaki sorriu meio de canto, não sabia mais o que dizer a ele, e ele não parecia passível de conversa.
- Eu estou indo embora.
- Não.
- Não o que?
- Não irá embora. Você veio e queria ficar, então fique, a casa é sua. Não sou mais uma criança, não vou olhar pra você como meu pai, nunca. Mas posso te conhecer como um amigo, problemático e desagradável.
Hideaki desviou o olhar a ele e suspirou.
- Eu não quero incomodar você, Hideki. Nem o garoto, ele parece com raiva.
- Apenas fique aí. Como já disse, aja como alguém qualquer, não tente ser pai.
- Tudo bem...
Hideaki disse e assentiu com a cabeça sutilmente, sabia que ele não queria, mas quando olhava pra ele, queria abraça-lo, ou tocar sua cabeça. Se lembrou do quão pequeno ele era quando nasceu, lembrava-se de seus cabelos negros e olhos tão amarelos. Caminhou para ele e tocou sua pele fria em seu rosto, mas soltou logo em seguida. 
- Amigos, tudo bem.
Hideki teria se desviado de seu toque se por mais um segundo continuasse. Assentiu e por fim daria meia volta.
- Só leva o garoto pro seu quarto, Yori é transformado e não é muito acostumado com isso.
Hideaki abaixou a cabeça, olhando o humano e assentiu.
- Tudo bem, no meu quarto. Qual é o meu quarto?
- Tem vários, você sabe, conhece a casa.
- Tudo bem, vou escolher um pra mim.
Hideki assentiu e o outro
 pegou o corpo novamente e seguiu para cima, acharia um quarto escondido o suficiente dentro da casa. Hideki seguiu o caminho até Yori. A noite havia começado estranha, terminado estranha, estava um pouco perdido aquela altura. 
- Hideki... Ele foi embora? Ainda sinto o cheiro dele.
- Ele está aqui. Está num dos quartos. - Hideki disse e se sentou, novamente na beirada da cama, sentiu pela primeira vez, dor de cabeça. - Acho que preciso de sangue, minha cabeça dói.
- Eu vou pegar pra você... Mas como ele terminou em um dos quartos? Eu o mandei embora.
- Eu disse que ficasse. Ele me contou uma história, falou sobre minha mãe. Foi um longo resumo provavelmente, mas, eu sei de algum modo, que não parecia ser mentira.
- Ele... Te disse o que houve quando te deixou? Ou por que? Ou ele só foi embora
- Ele falou. - Hideki disse, com a feição confusa de fato. - Falou sobre a gravidez ser acidental, sobre minha mãe viver com ele aqui. Aparentemente ele trabalhava num bordel, meu pai o comprou diante da gravidez. Disse que minha mãe era mais velho e mais forte que ele, que acabou gozando sem intenção, engravidou e por isso ficaram juntos. Que minha mãe dizia ser Akai Ito dele, mas que ele não havia sentido o mesmo e que, por terem a troca de sangue, mesmo que ele dissesse a ele que o amava, ele sabia que não, achou enlouquecendo ou ficando obcecado e ateou fogo em si mesmo.
Yori uniu as sobrancelhas.
- Isso é horrível... Ele te disse isso mesmo?
- Ele disse. Disse que chegou em casa e o jardim pegava fogo junto a ele.
Hideki disse, voltando a atenção ao menor. Embora o semblante estivesse com o cenho tenso e marcado, tinha os olhos um tanto vermelhos. Sentia uma sensação estranha, pelo homem ali e pelo que já havia partido. Yori u
niu as sobrancelhas, nunca o havia visto chorar, aquela era uma situação estranha, sentia o peito dolorido, estava agoniado. Caminhou até ele e o abraçou, firme. Hideki levou os braços ao redor de sua cintura miúda, ainda que estivesse barrigudo pela gravidez. Pensou, pensou sobre aquela situação e imaginava, que poderia facilmente enlouquecer daquela mesma forma.
- Hideki, respire fundo. - Yori disse, contra o ouvido dele, a voz era suave, sabia como ele era, era alguém que tinha que cuidar, e queria cuidar dele, por isso ficou ali. - Eu prometo que isso vai passar... Tá bom? Vai ficar tudo bem.
- Eu não preciso respirar. - O moreno disse e até deu um riso soprado embora no fundo ainda estivesse tenso. - Yori, sou como foi minha mãe. Eu enlouqueço se não posso ter o que eu quero.
- E o que você quer? Você não tem a mim e o seu filho? O que mais você quer?
- Não estou dizendo que me falta algo, eu quero dizer, sei que sou como ele. Ficaria louco sem você.
Yori uniu as sobrancelhas conforme o ouviu, mas sorriu em seguida e acariciou seu rosto, deslizando o dedo indicador por seu nariz e roçou o nariz ao dele.
- Mas eu estou aqui.
- E eu nunca vou deixar você ir.
- Eu não vou deixar você. Podemos lidar com ele, tudo bem.
- Eu não sei o que pensar dele. Sei que não preciso pensar sobre algo na verdade, uma vez que nunca me incomodei sobre a ausência dele.
- Bem, parece que você decidiu dar uma chance pra ele. Vamos ver o que vai dar, não se estresse.
Yori disse e cessou a fala por um momento, sorriu em seguida e segurou a mão dela, guiando para a própria barriga, era um pequeno chute.
- Não estou dando chance. Eu.. senti pena. Mas meu pai ele nunca vai poder ser.
Hideki disse e olhou para ele, tocou sua barriga e sentiu o movimento dela, sem precisar, acabou suspirando. Yori sorriu a ele e beijou seu rosto. 
- Acho que ela está nervosa porque você está nervoso, hum?
- Hum. - Hideki murmurou. - Papai já está calmo. - Grunhiu, quer dizer, falou baixo.
Yori assentiu e acariciou os cabelos dele novamente.
- Vamos fazer o jantar, o que acha? Gosta de macarrão com molho de sangue não gosta?
- Tudo bem. Eu... ainda preciso ir até o trabalho. Mas acho que agora não é uma boa ideia.
- Você pode ir, quando voltar eu estarei esperando com o jantar. - Sorriu. - Ophelia ficará comigo, ele não me fará mal.
- Ele não vai ousar tocar em você, eu ponho fogo nele.
- Eu não tenho medo, sei que você me defenderia.

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1 comentários:

  1. Eu agradeço demais por mais um capítulo desta fic maravilhosa!!
    Comentei mais no whats sobre ele 💜💜💜💜

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