Masashi e Katsuragi #22


- Continuo não gostando de mangas, não me obrigue.
Masashi disse ao virar o rosto, evitando o pedaço da fruta importada e preferida dele. Mas sorria, achando graça da insistência. E se levantou, sentindo-se um pouco cansado, dormira pouco.

- Acho que preciso de um chá. 
Disse a ele, baixo mas audível o suficiente e tocou os cabelos cuja os fios já eram brancos pelo tempo, pela idade. Mas ainda tinha uma boa postura, e agora os usava os fios mais compridos do que quando jovem, e costumava prendê-los com um laço, que ele fazia para si pelo início da noite. Usava um quimono preto e simples, com um obi azul cintilante. Ao se virar, pensou em perguntar a ele sobre seu chá preto, já que comia fruta, não tinha certeza se queria a bebida, e vez outra ainda se surpreendia ao notar seu olhar apaixonado e triste. Bem, talvez não estivesse mais jovem e bonito como ele gostava. 
- Não olhe assim, vamos comer bolo hoje, é meu aniversário.
Katsuragi desviou o olhar ao prato, guiando a fruta aos lábios ao invés de dar a ele e suspirou, observando-o logo em seguida, era lindo, e não acreditava que estivesse tão velho, sentia-se triste toda vez que lembrava disso, que não o teria por perto mais, e somente sabia de uma coisa, no dia em que ele morresse, por alguma doença ou idade, morreria com ele.
- Não acho que isso seja algo para se comemorar.
- Ah, mas você gosta de bolo. 
Masashi retrucou enquanto colocava a chaleira a ferver água para o chá. Preparou as xícaras por fim, duas. E claro que ainda sentia seu olhar pairar contra as próprias costas.
- Acho melhor você se sentar, ou suas pernas podem quebrar.
- Não seja idiota. - O menor riu e negativou. - Vai me ofender assim.
- Huh. Sua bunda ainda é uma delicia.
Masashi riu enquanto negativava. 
- Mentiroso, nunca mais a viu.
- Estou vendo agora enquanto carrega as xícaras. Tenho visão através das roupas.
- Uso
O menor disse e soou um pouco rouco. Levando consigo uma bandeja com xícaras de chá já pronto. E sentou-se próximo a ele. Mas no entanto, se levantou, e pegou na cozinha o bolo de pêssego que ganhou dele. Acima do doce, as velas não expunham a própria idade, ele odiava ver os números, mas ao menos, ficava feliz de ter passado tantos anos ao lado dele, embora raramente demonstrasse romanticamente como adorava estar vivendo ao lado dele. Embora hoje em dia, fosse tratado como uma porcelana. O bolo tinha tamanho suficiente apenas para dois, dois pedaços generosos no entanto, mas que conseguiam comer compartilhando. Katsuragi observou o bolo, abrindo um pequeno sorriso a ele, e mais parecia um filho dele do que amante, quer dizer... Não era mais amante dele há um tempo, namorados? Suspirou e ajudou-o a colocar os pratos na mesa, acendendo a velinha com a caixa de fósforos.
- Vamos.
Masashi sentou-se com ele e sorriu, esperando as velas acesas e esticou as mãos a segurar suas mãos ainda jovens, embora não fosse um adolescente, era ainda o quarentão intacto e bonito que sempre conhecera. E com as luzes baixas, somente a iluminação suave de uma lamparina junto a velinha, a do cômodo já havia sido apagada. E sem cantarolar, fechou os olhos e soprou o fogo, apagando-o a deixar somente uma fina linha de fumaça aparente. E quando voltou a olhá-lo, notou o mesmo sorriso feliz, mas como se fosse quebrar. E claro, ainda pedia desculpas para ele, silenciosamente. Katsuragi esperou um minuto inteiro para que ele assoprasse as velas e manteve-se em expectativa, havia feito aquilo nos longos anos que se seguiam, e não via mais graça, mas ele parecia ver. Sorriu ao vê-lo apagar a vela, porém tentava conter as lágrimas nos olhos, não podia se mostrar triste no aniversário dele, mas sabia que era apenas mais um passo para não vê-lo nunca mais, não queria ter aquela discussão com ele de novo, podiam ter vivido juntos, podiam ter tido filhos... Maldita vontade de ser humano, um humano com uma vida extremamente desinteressante.
- Feliz aniversário.
- Eu sinto muito, Katsuragi. 
Masashi disse, enquanto com os polegares acariciava o dorso de sua mão. Era um idiota, podia sorrir, mas sabia que aquela data era um pouco difícil para ele, então se quisesse chorar, consolaria-o, ainda que fosse inconsolável. E ao chegar mais perto, acariciou seus longos cabelos negros, e dali, podia ouvir o som do mar, da casa onde moravam, a mesma que ganhara dele há tempos atrás, ainda que fosse relutante sobre deixá-lo viver num lugar tão quente assim. E puxou uma de suas mãos, afagando-a com a bochecha, e não o beijou. Imaginava que um beijo naquela idade era um pouco desagradável. 
- Quero que seja feliz, sabe disso?
Katsuragi manteve-se em silêncio a sentir todas as carícias dele sobre si, e obviamente o teria beijado, não se importava sobre quantos anos ele tinha, tinha os dele e mais cem. Desviou o olhar ao bolo, meio irritado por seu comentário, sem poder retrucá-lo.
- Quando você se for, eu também vou.
- Não vai. E não vou morrer tão logo, não seja pessimista. E sabe que, quando me for, vou depois de ter uma vida incrível a seu lado. Então quero que seja feliz, quero que seja capaz de sorrir e de fazer alguém feliz como fez a mim, talvez quem sabe um bebê? Mas, se um dia você acabar partindo, vamos nos encontrar novamente.
Katsuragi desviou o olhar ao ouvi-lo, contendo-se, porém perdeu a paciência logo na metade de seu discurso e logo se levantou, empurrando a xícara de chá ao chão num soco contra a mesa.
- Podíamos ter tido esse bebê juntos! E você sabia disso! Você podia ficar comigo pra sempre! Mas não, quis viver cinquenta anos, apodrecer, e ir embora, e vai me deixar sozinho aqui nesse inferno! 
Falou, as lágrimas já escorrendo pela face a medida em que se dirigia a ele, guiou uma das mãos sobre o rosto e limpou-as.
- Sabe por que eu não posso arrumar outra pessoa? Porque eu não vejo outra pessoa dormindo na minha cama. Quando você morrer, eu vou morrer junto, se não me matar, morro de desgosto. Vampiros só tem um parceiro na vida, e você já sabia disso. Por que não me deixou te transformar? Porque você quis ser tão egoísta? 
Falou em mais um soco contra a mesa, que balançou o móvel, ruindo pela própria força, vezes maior do que a de um humano.
Masashi trepidou ao ouvir o brusco movimento contra a mesa, e até se afastou colado a cadeira. Ouviu sem protestar suas lamentações. O que podia fazer? Xingá-lo e expor o ponto de vista? Ponto este que já havia demonstrado tantas vezes, mas que de nada adiantava. Ele podia lamentar, ele podia expor sua tristeza. Mas sabia que havia "apodrecido" somente não queria ouvi-lo dizer isso algum dia, e talvez, se tivesse pensado nisso antes, não estariam ali. Deduziu que no fim devia ter ido embora, antes que aquilo acontecesse, mas ao mesmo tempo não queria que ele se sentisse abandonado. Suspirou e observou as mãos de dedos cruzados, notando-a magra e com marcas de idade. Levantou-se, e se afastou por pouco ao ouvi-lo novamente contra a mesa, mas por fim esticou os braços a abraçá-lo, e tentava imaginar como ele podia dizer a um velho que ainda o amava. Katsuragi sentiu o abraço dele contra o corpo e manteve-se imóvel, estava irritado, magoado na verdade, e não era por um motivo simples, desviou o olhar a ele e nem se quer se moveu.
- Você trocou a mim, trocou uma família comigo, por um simples raio de sol.
- Sh... - Masashi disse, e tocou seus lábios num beijo superficial, que há algum tempo não dava. - Mas foi por saber que iria acabar, que eu aproveitei todos os dias como se fossem o último.
- Você podia ter aproveitado uma eternidade, seu idiota... Cretino...
Masashi riu, baixinho e rouco. 
- Cretino combina mais com pessoas jovens.
- Cale essa boca, se não eu vou transar com você aqui mesmo e não importa o quão velho você esteja.
Masashi sorriu a ele, enquanto tocava seu rosto ainda jovem. Beijou-o, no entanto em sua testa. 
- Sayonara. - Sussurrou-lhe contra a pele.
- Você não pode me deixar, Masashi... Não pode... 
Katsuragi murmurou e sentiu o toque dele distante na pele, sentia-se horrível, e mesmo morto, nunca havia se sentido daquele modo. Tentou segurar a mão dele, mas não havia mão, não havia mais nada. Abriu os olhos, num pulo na cama, a respiração ofegante, e até mesmo o corpo estava coberto de suor.
- Masashi.... Masashi?! 
Virou-se rapidamente a observá-lo, as lágrimas já nos olhos e segurou-o, chacoalhando-o na cama até observar sua face jovem e sorriu, feliz por ter sido um sonho. Abraçou-o, apertando-o entre os braços, tão forte que poderia quebrar seus ossos, mas é claro, que cuidadoso.
- Meu deus, meu Deus, meu Deus...
Masashi franziu o cenho, sentindo-se desconfortável no sono. O que se intensificou com o aperto repentino que sentiu, até mesmo associou ao sonho que tinha, de repente, da casa de praia agora estava preso por uma cobra, sendo enrolado por ela. Gemeu dolorido e acordou com os olhos arregalados quando ouviu-a sibilar o próprio nome. 
- Ah!
Katsuragi observou-o e beijou-o várias vezes em toda a face, nos lábios, principalmente, várias e várias vezes.
- Meu Deus, eu te amo... Você está jovem... Eu te amo, te amo muito...
O menor piscou pesadamente, com os olhos inchadinhos de sono, mesmo embora o coração estivesse batendo rápido. 
- Você era uma cobra... - Disse, meio perdido, mas abraçou-o pelo pescoço. - Eu também, eu também...
Katsuragi desviou o olhar a ele e arregalou os olhos, permanecendo a observá-lo daquele modo por alguns segundos.
- Você... Também?
- Eu... Também era uma cobra. - Disse o menor, de olhos fechados.
- Mentiroso! 
Katsuragi riu e beijou-o nos lábios, metendo a língua em sua boca e procurou pela dele enquanto puxou-o sobre si como se puxasse uma criança.
- Vem, vamos fazer amor, vamos fazer amor o ano todo!
Masashi arregalou os olhos novamente quando a boca penetrada vigorosa. E segurou seus ombros, era humano, precisa da higiene pela manhã. 
- Hum... Iie, não... Tsu...ragi. Eu preciso tomar banho.
- Que banho o que moleque, vem logo. 
Katsuragi falou e sorriu a ele, abraçando-o contra o corpo sem deixá-lo sair.
- Calma, calma. Como consegue acordar tão disposto...
- Eu sonhei que você estava velhinho... Quase morrendo, e eu tinha que ficar olhando você assoprar as velinhas... E me trocar, dizendo que iria embora e que queria que eu fosse feliz.
- Velhinho e velinhas? 
Masashi riu, entre os dentes. Mesmo embora, de algum modo, se recordasse de um sonho quase assim, lembrava-se de algo ruim, e de cabelos brancos, mas não tinha certeza. 
- Por que tão feliz então? O sonho foi ruim.
- Mas quando eu acordei, vi você aqui, lindo, jovem e meu, só meu, nem um pouco perto de morrer ou de alguma coisa ruim.
- Vou morrer de tanto fazer sexo. - Riu baixinho.
- Eu te mordo antes.
- Você... Disse que queria que eu fosse feliz... Queria que eu arrumasse outra pessoa e disse pra eu ter um filho com outra pessoa. Eu quis bater em você. Eu não poderia nunca pensar em arrumar outra pessoa, eu não quero ninguém.
- Eu não disse de verdade. 
Masashi disse e acariciou seu rosto, beijando-o em sua testa. E voltou-se para o lado, deitando-se na cama, pensando sobre seu sonho, e sobre o próprio, tentando se recordar corretamente do sonho que teve. 
- Foi um sonho.
- Você não faria isso... Não é?
- Isso o que?
- Ficaria velho e me deixaria sozinho.
- Iie, só um sonho. - O menor disse, acariciando seus cabelos longos.
- Hum. - Katsuragi assentiu. - Eu quero ter uma família com você.
- Não ia gostar de mim velhinho? - Sorriu.
- Não, não diga uma coisa dessas se não eu te estapeio.
- Não ia? Que amor egoísta. - Masashi resmungo, brincando com ele.
- Egoísta é você, me abandonar.
- Estou perguntando se gostaria de mim velho.
- Sim, é obvio.
- Mentiroso.
- Verdade.
Masashi sorriu a ele, observando aquelas finas linhas de expressão. Tinha idade para ser o próprio pai, mas era inacreditavelmente bonito, de modo que duvidava que um dia pudesse ter sido mais bonito que isso, talvez não tenha sofrido ação do tempo, exceto pelas mesmas linhas nos cantos de seus olhos, sutis, mas que faziam parte de sua beleza. E gostava delas. Algum dia, lera em um dos livros que o amor é difícil de se perceber. E que expressá-lo em palavras, era muito mais difícil quanto maior fosse o sentimento. Mordeu o lábio enquanto sorria e brincou com seus fios de cabelos suavemente dispersos na testa. 
- Uau... Lindo.
Katsuragi desviou o olhar a ele, meio silencioso e recebeu o elogio, meio de repente. Sorriu e deslizou uma das mãos pelos cabelos dele, acariciando-o.
- São seus olhos, hum. - Murmurou e aproximou-se, beijando-o na testa sobre os cabelos. - Deus, você é lindo até com o rosto amassado de sono.
- Gosto muito de você, Katsuragi. - Masashi disse, sentindo seu beijinho na testa.
- Eu também te amo, Masashi. 
O maior sorriu a ele e tocou-o com um dos dedos em seu nariz, entendendo a mensagem. O menor sorriu e não disse o contrário.
- Vem cá, que eu vou te transformar.
- Nem vem.
- Vou sim, da esse pescoço aqui.
- Nãão!
- Siiim! 
Katsuragi riu e beijou-o várias vezes no pescoço, ao invés de mordê-lo.
- Nãão... 
Masashi retrucou-o com o mesmo timbre. e afastou-o, ou tentou, fingindo empurrá-lo. O maior riu e logo beijou-o nos lábios, sorrindo a ele.
- Vamos dormir mais um pouco, hum. Amanhã vamos aonde você quiser.
- Por quê? - Masashi disse, não tendo porque do mimo.
- Porque eu te amo, é por isso.
- Hum... Bem, vamos comer bolo. Pêssego.
- Não!
- Eh?
- Digo... Certo... Pêssego... 
- Eh? - Masashi indagou, sem entender.
- Seu bolo de aniversário era de pêssego no sonho.
- Foi um sonho, Katsuragi. Estou aqui e estou jovem.
- U-hum. 

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