Ikuma e Taa #74


Taa apagou o cigarro, primeiro que fumava em meses antes de entrar na cafeteria e sentou-se em um dos bancos altos, observando o cardápio rapidamente, já esteve ali antes, lembrava-se disso, só não corretamente, só se lembrou quando viu a garçonete que parou em frente a si.
- Não foi você que...
- Hey, como vai?
Taa abriu um pequeno sorriso a observá-la.
- Com uma imensa vontade de te estapear.
- Espero que não tenha guardado rancor, ora, fiquei com dó do rapaz que estava com você, ele é tão bonito e parecia tão dedicado... Como ele está? Tem o telefone dele?
Taa manteve-se em silêncio a observá-la um pequeno momento e pegou o café servido como de costume pela outra garçonete, bebendo um pequeno gole enquanto a observava, a expressão ainda séria.
Taa saiu do beco pouco após a meia noite e lambeu os lábios algumas vezes, tentando limpar a marca de sangue que havia no canto dos lábios, agora bem alimentado, voltaria para casa, quando cessou o caminho ao ver a garota em frente a si, quase um pedaço de carne com alguns panos sobre o corpo. Arqueou uma das sobrancelhas e caminhou até ela, abaixando-se a sua frente.
- Quem é você?
- Oi, você é alto né?
Taa riu baixinho e assentiu a ela, retirando de dentro do bolso um pequeno docinho embrulhado.
- Toma.
- Obrigada. Qual é o seu nome?
- Pode me chamar de Taa, e o seu?
- Taa... - Ela sorriu com os dentinhos brancos. - Sayu.
- E quantos anos você tem?
- Assim. 
Ela mostrou cinco dedos a ele e sorriu novamente. Taa sorriu a ela, acariciando os cabelinhos negros e curtos e ajeitou sua roupinha rasgada no braço.
- Onde está sua mãe? Ou seu pai?
- Eles morreram. Eu moro ali. - Apontou o beco.
- ... Mas você não pode morar aqui. 
Taa murmurou a ela e desviou o olhar ao local, notando a caixa colocada no canto e os olhos vermelhos que rondavam o lugar, passeando por trás da rua.
- Hey, largue a menina, eu vi primeiro.
Taa ergueu-se e virou-se a observar o rapaz na rua.
- Viu primeiro? Ora, por favor.
- Estou esperando há horas.
- Vá pra casa, estuprador.
- Ah não... Você é um humano? Digo, um vampiro transformado.
Taa ouviu-o rir, alto a se aproximar de si e arqueou uma das sobrancelhas, permanecendo parado ali a observá-lo, os cabelos negros meio bagunçados, era estranho o rapaz, nunca o havia visto, mas os olhos amarelos não mentiam.
- ... Merda.
O drinque pulou para encontrar a mesa, uma pequena dose, que pulou para fora do pequeno copo antes mesmo de ser levada para a boca, um desperdício. Inicialmente, Ikuma sentira em si uma grande sensação de asco, que foi minutos depois sobreposto por prazer, e que não era sexual, do contrário, há muito não estaria ali. Imaginava que estaria se divertindo, ficava feliz por isso, provavelmente pegara alguma boa refeição por ali. No entanto, agora sentia uma sensação de felicidade ser substituída por euforia, preocupação. Levantou-se da mesa após finalizar alguma simples conversas de boate, e deixou o local, observando a noite, que para muitos fria, no entanto para os frequentadores da boate, o clima mais agradável. Focou-se a buscar as sensações do companheiro, e mesmo seu cheiro que seria vago no meio da noite, mas o acharia, com certeza. 
Taa segurou a garotinha, mantendo-a atrás do corpo, tentando mantê-la numa distância razoável do vampiro cheio de piercings que observava a si a frente e não o conhecia, nem reconhecia o cheiro.
- Eu nunca vi você por aqui.
- Eu tenho milhares de anos, rapaz, enquanto você deve ter uns dez, ou vinte.
Taa desviou o olhar, era óbvio que ele estava certo, e o pior, se ele fosse como o próprio marido, devia ser bem inteligente.
- Por que quer a garota? Tem tanta gente boa pra sugar por aí, esse pedaço de carne não vai nem fazer diferença pra você.
- Ela é carne fresca, e pequena, é melhor pra segurar e raspar a carne dos ossos. 
Ele sorriu a mostrar os dentes brancos e pontudos.
- Ah vá, parece um vampiro que saiu de livros infantis de horror. 
Taa segurou-a com firmeza contra si, tentando não deixar vê-la o rapaz a frente, embora ela espiasse com os olhinhos pequenos entre as frestas, e não tinha medo, já tinha visto tanta coisa. Manteve-se parado e observou-o a caminhar em direção a si até parar em frente.
- Se alimentou bem, pelo visto, talvez eu deveria tomar o seu sangue e não o dela.
Ele abriu um sorriso, observando-o e tentava fingir que não sentia medo, mas estava tremendo e muito.
- Acho que não vai querer fazer isso...
- Ah é?
Num movimento, Taa se viu entre seus dedos, erguido pelo pescoço e uniu as sobrancelhas a guiar ambas as mãos sobre o lugar, tentando impedir que ele apertasse a jugular como fazia, e seria impossível respirar, se fosse humano, o problema é que sentia a pressão mesmo assim na cabeça e óbvio, não era nada confortável ter um vampiro tentando esmagar seu pescoço. 
Ikuma sentia uma sensação que não vinha de si, estava com medo e agora também desconfortável. Ao mesmo tempo, podia confundir o medo com uma sensação de raiva, e que não era de nenhuma outra pessoa senão de si mesmo. E esperava poder transmitir essas sensações ao companheiro, seria suficiente para fazê-lo perceber de que chegaria lá por ele. Por sorte, ou não, seu medo fazia o cheiro intensificar o suficiente para seguir o caminho mais depressa, ainda que fosse um vampiro e que não morresse com facilidade, não queria ninguém encostando os dedos nele. Ao chegar metros suficientes para vê-lo, sentiu cheiros misturados aos dele, humano, vampiro. 
- Ah, seu filho da puta. 
Disse, pouco antes de segurar o vampiro desconhecido e fazê-lo soltar o parceiro, não só com a mão em seu pulso, quanto os dedos em seu pescoço, que o apertou da mesma forma como antes segurava o próprio companheiro. Taa fechou os olhos por um instante, e sentia que a cabeça iria explodir a qualquer momento, tamanha era a pressão que tinha, fora levantado do chão por ele, e mesmo que tentasse falar, não conseguia, porém sentia os sentimentos do noivo, sabia que ele não estava longe dali e que iria salvar a si. Quase não fora possível ver o rapaz quando fora puxado, fazendo-o soltar a si e caiu ao ser livre de suas mãos, as pernas fraquejaram e só então pôde respirar, a mania humana que não largava, óbvio, despencou no chão e tossiu quase até arrancar os pulmões do peito. Desviou o olhar a ambos, de canto, e segurou a pequena que ainda estava próxima de si, abaixada a segurar o próprio casaco, e tentava reanimar a si enquanto tentava respirar, chacolhando a si com as pequenas mãozinhas.
- Não morre não... Não me deixa sozinha...
- Iie... Tudo bem... - Taa falou a ela e segurou sua mãozinha. - Tudo bem, me espere atrás da lata de lixo, ta bem? 
Observou-a e a viu assentir, correndo em direção ao beco escuro mais uma vez.
O rapaz arregalou os olhos ao sentir o vampiro tomar o próprio pescoço, e se surpreendeu realmente ao notar que o bastardo estada acompanhado de um vampiro tão velho, talvez ele mesmo o houvesse transformado, porque nem o via direito, mas sabia que ele sentia raiva. Mesmo assim, não afrouxou a pose que tinha e segurou sua mão, apertando-a a tentar retirá-la de si, mesmo que sentisse a mesma pressão que o outro sentiu quando o apertou, tomou força ainda a tentar chutá-lo em suas pernas e onde o acertou, sabia que havia doído, mesmo sem ter a mesma força que ele. Ikuma virou-se por um momento, fitando o mais alto, tal como a pequena criatura colada a sua roupa. Por um momento até se distraiu tentando entender o que diabos era aquilo. Tão logo o chute dolorido na canela foi suficiente para despertar noção da situação e encarou o vampiro, que parecia inexperiente, embora não fosse, mas sua aparência desgarrada quase parecia um apelo, um convite de um cão que late sem morder, talvez o julgasse, mas o que tinha certeza era de que não importava o quão forte e experiente o fosse, não seria mais do que a si. 
- O que há, cabeludo? Acha que esse chutinho na canela vai me machucar? Se eu chutar a sua, sua perna vai voar e parar naquele poste ali, do outro lado da rua.
- Está falando do seu namoradinho? Não sabia que a árvore estava com você, achei que era só um humano tentando bancar o vampiro. Diga a ele que o pedaço de carne que correu é meu e eu quero de volta e vamos esquecer o problema. 
O rapaz falou a puxar as mãos dele, afrouxando o aperto na garganta para que pudesse falar, mesmo abafado.
Taa arqueou as sobrancelhas ao sentir a pontada em si, a dor causada pelo chute dele e não fora pouca, talvez tivesse realmente o machucado, já era um vampiro velho, não tanto quanto ele, talvez ainda nem fosse adulto, mas era velho.
- Eu a achei, ela não é sua. Deixe-a em paz.
- Vai se foder. 
Ikuma disse e tornou a pressionar o polegar contra o pomo em sua garganta. 
- Acha mesmo que estou com cara de quem está negociando? Você é tão lixo que ensaiou pra pegar uma criança, e se ele disse que a criança é dele, é dele e você vai calar a boca. Não estou afim de te bater, moleque, de verdade. Mas se encostar no meu parceiro, embora a carne não seja de boa qualidade, meus filhos vão jantar e roer seus ossos no dia seguinte.
Taa levantou-se, ainda meio trêmulo, dolorido e estreitou os olhos ao rapaz que o outro ainda segurava. O garoto arqueou uma das sobrancelhas, irritado e orgulhoso demais para desistir da briga, o problema é que mesmo não respirando havia engasgado devido ao aperto dele e uniu as sobrancelhas em seguida com a ameaça, observando o local ao redor, tentando encontrar um meio de fugir.
- Ikuma... Tudo bem, pode soltar. Ele já está se mijando de medo mesmo.
- Você ouviu? 
Ikuma indagou e suavizou o aperto, suficiente para deixá-lo responder. 
- E não ache que sou bonzinho o suficiente só porque estou te avisando. Isso não é uma ameaça, são meus planos futuros no caso de você aparecer aqui novamente e tentar encostar no que é meu ou no que o meu parceiro disser que é dele, entende? Tenho mais de trezentos anos, e suponho que você não seja tão jovem a ponto de não saber o quanto esse foi tempo suficiente pra eu ser capaz de te fazer sumir com um sopro, tudo bem? - Indagou novamente e sorriu ao rapaz. - Agora você pode descer, e ir junto a seu grupo tomar sopinha e trocar as fraldas.
Taa manteve-se em silêncio ao ouvir o outro e não contestaria, nem tentaria impedir, também era esperto pra saber que não devia mexer com o que ele estava ameaçando. O rapaz assentiu algumas vezes, meio a contragosto, mas fora obrigado, ou seria morto por ele e era algo que não queria, não naquele dia ao menos, brigaria com ele depois.
- Me solta... 
Ikuma fitou-o, de olhos estreitos, um tanto analítico. 
- Se você pensar em mexer com ele novamente, eu vou detonar você. Qual a porra do seu nome?
O rapaz observou-o de canto e negativou, não diria a ele, ainda mais se conhecesse os próprios pais, teria problemas e somente debateu-se.
- Me solta!
- Se você não falar, eu vou te levar até a minha boate e eu tenho certeza que alguém de lá vai saber quem é você.
Ele estreitou os olhos, irritado ainda e debateu-se mais uma vez.
- Shinji! Caralho.
- Shinji? Ok, vou te levar até a boate.
- O que?! Mas não foi isso que me prometeu!
- Esse não é seu nome. Me diga seu sobrenome.
- Não, você vai falar com os meus pais, me deixe ir, seu parceiro está intacto, nem machucado está, vai.
- Anda, me diga.
- Serizawa... Shinji Serizawa.
Taa arqueou uma das sobrancelhas num risinho. Ikuma arqueou ambas as sobrancelhas, elevando-as e fitou-o como se estivesse surpreso. 
- Uau, Taa, eu não queria dizer a você, mas tive um filho por aí em algum momento da minha vida. Ou será que nós tivemos juntos e não nos lembramos? Será que foi um aborto não bem sucedido?
Taa riu novamente, negativando e levou uma das mãos sobre a face, fingindo não estar acreditando no garoto ou na situação em si.
- O que? Pare de zombar de mim, vovô.
- Vovô? Se seu sobrenome é Serizawa, eu sou seu pai.
Ele arqueou uma das sobrancelhas.
- Ah, tá, conta outra. Você não pode ser da família mais antiga, só restam uns... Quatro vampiros puros dela.
- Ah é? E o que você sabe, pirralho? Sabe os nomes?
- Não, meus pais sabem... São histórias pra crianças, se você é um vampiro nascido há tanto tempo, tem realmente mais de trezentos anos...
- Pra criança? Então ainda ouve historinhas pra dormir? Vou levar você pra sua casa, e aí seus pais vão saber quem são os Serizawa.
- Não, não... Eles me matam, por favor, me deixe ir, desculpe... Se eles souberem que eu me meti com você eu nunca mais vou poder voltar pra casa.
Taa observou a ambos, com um pequeno sorrisinho nos lábios, porém estava curioso sobre o que ele havia dito antes, observando o outro, e era incrível o que um nome podia fazer.
- Não se meta novamente com nada que é meu. Se encostar os dedos no meu parceiro, vou fazer com você a mesma coisa. Só não vou te levar pra casa agora, porque tenho que levar minha lagarta embora. Não estou a fim de machucar um garoto. Vá embora e não pegue crianças, pegue mulheres adultas, são fáceis. 
Disse e enfim o soltou. Teria feito com ele pedaços para a sopa que mencionou, se fosse adulto. Se não fosse jovem o suficiente para pensar nos próprios filhos enquanto o segurava pelo pescoço. Taa manteve-se a observar a ambos, e o nó já estava na garganta desde o inicio, porque não sabia o que ele faria com o garoto, pensava nos próprios filhos nas mãos de outros, embora soubesse que eles não seriam tão mal educados. O rapaz assentiu algumas vezes e fez uma pequena reverência a ele, desviando o olhar do rapaz de cabelos cinzas logo atrás dele, envergonhado e correu para longe deles. Ikuma observou o rapaz, que correu dali. Perdendo todo seu jeitinho prepotente. Até então, se voltou ao parceiro e caminhou até ele. Tocou-o no pescoço numa breve carícia. 
- Precisa de sangue? Parece bem alimentado.
Taa suspirou, aliviado quando o viu partir e desviou o olhar ao outro, ouvindo-o falar consigo e realmente estava, tinha apenas uma leve dor no pescoço e poucas marcas roxas onde os dedos dele haviam apertado. Manteve-se parado por alguns segundos e por fim o abraçou forte, apertando-o contra o próprio corpo.
- Achei que não veria mais você...
- Uh, não ache que alguém pode te fazer mal. Vou sempre achar você. - Ikuma afastou-se o suficiente para selar seus lábios. -  E quem é o chaveiro?
Taa retribuiu o selo e suspirou, tentando parar de tremer por um segundo e sorriu a ele, desviando o olhar a pequenininha que observava a ambos curiosamente. Chamou-a com uma das mãos e viu-a correr em direção a si.
- O nome dela é Sayu. Disse que os pais dela morreram, estava dormindo numa caixa ali no beco... Não podia deixar ele comer ela, olha o tamaínho disso.
- Oi. - Ela acenou ao outro, observando-o. - O senhor não é tão alto...
- É, eu sei. Mas o que não tenho de tamanho eu tenho de... - Ikuma disse e voltou-se ao companheiro. - Como foi parar nessa caixa? Quem te deixou aí?
- Hey. 
Taa falou, cessando sua fala e desviou o olhar a pequenininha, abaixando-se a pegá-la no colo, observando-a enquanto falava.
- Minha mamãe tinha uma irmã, quando a mamãe morreu, ela ficou com a casa, disse pra eu ficar aqui que ela vinha me buscar, aí eu estou esperando.
- Ah, é? O que você comeu durante esse tempo?
- Tem uma moça que mora ali perto num cobertor. Ela me dá comida de vez em quando...
- Que tal nós irmos até lá? Sabe onde é a casa?
- Sei sim. É depois da sorveteria que tem um sorvete bem grande na frente. Minha mamãe sempre me comprava sorvete depois do trabalho...
- Então vamos lá. - Ikuma sorriu a pequenina. - Você é linda. Parece minha filha quando era pequena. - Disse a criança no colo e então caminhou junto ao parceiro. - Espero que esteja com fome. - Disse a ele.
Taa sorriu ao maior ao ouvi-lo e observou a pequenininha de cabelos negros e olhos bem cinzas, era linda, como alguém conseguia deixar uma criança como aquela na rua?
- Pode descansar no meu ombro se quiser.
- Mas eu estou suja...
Taa riu baixinho, achando engraçado que ela já soubesse tanta coisa mesmo pequenininha.
- Não tem problema vou te dar um banho quente quando chegar em casa, está com frio?
Taa sentiu-se mal ao vê-la assentir, repousando a cabeça sobre o próprio ombro e retirou o casaco que usava, colocando ao redor do corpinho dela.
- O pior é que acabei de comer, mas sempre tem espaço pra mais. Afinal, estou comendo por dois.
- Então vamos jantar por lá. Conseguimos fazer uma sopinha, pra nós e pra ela. Teremos uma boa carne, hum? 
Ikuma indagou ao companheiro e caminhou até o lugar. Logo ao chegar, abriu a porta, mesmo que não estivesse realmente aberta, encontrando lá uma jovem, não demais, mas para si era quase um bebê. 
- Boa noite, vagabunda. - Disse com um sorriso.
Taa sorriu a ele, mordendo o lábio inferior.
- Quase sinto a carne entre os dentes, ah, o coração dela deve ser uma delicia. 
Murmurou e averiguou se a pequena ainda estava acordada, mas estava dormindo, estava tão magrinha, talvez morta de fome e sentiu ainda mais raiva da mulher por isso. Adentrou a casa junto dele e quase riu ao ouvi-lo, mantendo-se escondido por um pequeno tempo, até achar um lugar para colocar a pequena e ajeitou-a quentinha no sofá.
- Ah meu Deus, quem é você...? O que... O que faz aqui? 
Disse ela a caminhar para trás e era óbvio que estava se preparando para dormir, estava de pijama.
- Eu vou chamar a policia!
- Ah, mesmo? Eu poderia dizer o mesmo pra você, a respeito da garotinha que largou na rua pra ficar com a casa, que por sinal, é dela. Isso, se eu estivesse disposto a te deixar nessa casa por mais alguns dias, mas não. Hoje meu docinho vai fazer uma sopa aqui, e vai servir a dona da casa.
Taa sorriu a observar a mulher, meia idade, não era tão jovem e assentiu a aproximar-se dela, mantendo-se junto a seu corpo para evitar que fugisse.
- O que? Vocês... Como vocês sabem? Estão malucos? Eu...
- Ora, pare com isso e evite nosso trabalho de correr atrás de você.
- Não foi minha intenção, eu deixei ela lá só até me estabilizar... Eu ia buscar ela... Eu ia...
- Ah, ia sim. Depois que ela morresse seca, com fome e frio. Eu deixo você levar os ingredientes pra cozinha, lagarta.
- Ah, me deixa matar, adoro quebrar pescoços, fazem um barulho legal. 
Taa falou a ele e sorriu, segurando-a com ambas as mãos.
- Por favor... Por favor não me mate.... - A mulher uniu as sobrancelhas e deixou que as lágrimas escorressem pelo rosto. - Por favor... Eu faço o que quiserem.
- Nem ofereça, não tem nada que eu queira, e você é uma maldita, não merece viver.
- Pode matar, eu não faço questão. Mas leve pra cozinha. Corte em cubos.
Taa assentiu e puxou-a pelos cabelos, ouvindo o grito desnecessário aos ouvidos e segurou-a com ambas as mãos, num estalo, virou seu pescoço e sentiu o corpo cair sobre si, mole.
- Odeio gritos. Quer mesmo que eu corte?
- Eu também. Gosto dos seus. Será que acordou a criança? Sim, corte em cubos, tire a pele.
- Ah, a criança não come com sangue então, tem de ser diferente.
- Fique com ela um pouco enquanto faço isso. Pode deixar que vou fazer diferente. - Piscou a ele.
- Vou ajudar ela com o banho.
Taa assentiu e aproximou-se do outro, selando-lhe os lábios.
- O nome dela é Sayu.
- Sayu, Sayu. Não vou me acostumar tão logo, mas tudo bem. - Ikuma caminhou até o lugar onde deixava a pequenina e pegou-a no colo. - Acorde, Sa... yu?
- Eh? 
Ela moveu-se devagarzinho no sofá, em meio ao casaco quentinho do outro e não se lembrava da ultima vez que havia dormido tão bem.
- Ah, o moço bonito... Oi.
- Vamos tomar banho, moça bonita?
- Vou ficar limpinha?
- Sim, e bem quentinha.
- Então ta bom. - Ela esticou os bracinhos.
Ikuma pegou-a no colo, levando-a consigo a buscar pelo banheiro da casa, desvendando o lugar. Ao encontrar um dos banheiros, observou a banheira e uma ducha. 
- Quer na banheira ou quer no chuveiro?
Ela sorriu, animada a observar os próprios bichinhos que ainda estavam ali, de borracha.
- Ah, aqui era o seu. 
Ikuma disse e ligou a torneira, deixando encher o suficiente da banheira, enquanto tirava a roupinha suja e gasta da pequenina. Colocou-a dentro da água, que ao medir temperatura, parecia quente demais para si, mas imaginava que não tanto para ela. Ela adentrou o local, encolhendo-se pouco, meio envergonhada por estar sem roupas na frente dele, como o outro havia constado, já era inteligente para a própria idade. Apreciou a água quentinha e pegou a esponjinha em formato de polvo, entregando a ele.
- Não precisa ter vergonha. Papai não te dava banho? - Ikuma disse, e aceitou a esponja, usando o sabonete para formar uma espuma fofa.- Bonita sua esponja. 
Disse e levou a mão a esfregar seu corpo tão pequeno.
- Iie, eu quase não via ele... - Ela murmurou e sorriu ao ouvir sobre a esponja. - É minha favorita. - Desviou o olhar a ele enquanto passava a esponja sobre o próprio corpo e erguia os bracinhos, ajudando-o. - Você vai ser meu novo papai?
Ikuma resmungou para si mesmo ao tê-la de enxaguar, sentindo a temperatura um pouco desconfortável, embora suportável. Deixou a esponjinha por um minuto, e buscou um shampoo que não era de criança, mas era suficiente de momento. 
- Hum, não sei, se você for uma boa menina.
Ela uniu as sobrancelhas.
- Mas... Mas eu sou boazinha. Eu... Eu juro que eu nunca mais como sorvete se você for meu papai.
- Não ligo pro sorvete. 
Ikuma disse, e após o término, deixou-a brincar um pouco na água. Ela assentiu, abaixando a cabeça, sem ter o que dar a ele e pegou um dos patinhos o qual brincava, estendendo a ele, tocando-o em sua mão, bem maior que a própria.
- Tó.
Um patinho?
- É... Mas ele... Ele flutua e faz barulho de patinho.
Ikuma apertou o patinho, fazendo ruir e brincou com ela na água.
- Pergunta pro moço alto se posso ser o seu papai, se ele deixar, eu vou ser.
- Ta bom... O moço alto é legal, ele vai deixar. - Ela murmurou e observou-o novamente. - Ele vai ser meu outro papai?
- Se eu for seu papai, ele vai ser.
Ela sorriu e assentiu.
- Por que você tem olhos vermelhos?
- Porque eu sou como um personagem de história. E eles são amarelos, olha. - Ikuma disse e chegou pertinho dela, mostrando-os. - Vamos lá, o moço alto está fazendo sopa.
- Ah, é verdade... São bonitos... - Ela sorriu e ergueu os bracinhos, esperando que ele retirasse a si da água. - Se eu for sua filha, vou ter olhos assim? Sopa? Eu quero!
- Hum... Talvez. 
Ikuma disse, pensando sobre a indagação da pequenina e ao deixá-la no banheiro por um instante, buscou uma toalha com qual a pegou no colo e levou para a cama, secando-a. Ela sorriu ao ver o próprio quarto novamente e manteve-se em silêncio enquanto ele secava a si, indicando a gaveta onde tinham as próprias roupinhas. Ikuma caminhou até a gaveta, e escolheu algumas roupas mais simples, vestindo-a. O casaco mais pesado pegou numa das portas do guarda-roupas, era rosa e sem peso, mas parecia macio e bem quente, como um vestido, acima das roupas anteriores. 
- Está quentinha?
Ela assentiu, ajudando-o a vestir as roupinhas em si e ao finalizar puxou o ursinho sobre a cama, mostrando a ele.
- Olha, esse é o meu favorito... O nome dele é Fred.
- Fred? Ele é tão fofo quanto você, gatinha. Vamos lá? 
Ikuma disse, pegando-a no colo após secar seus cabelos curtinhos, mas nãos os penteou. Ela esticou os bracinhos e abraçou-o, deixando-o levar a si junto do ursinho e sorriu, repousando a face sobre seu ombro.
- Ikuma? Já está pronto, venham comer!
- Estamos descendo. - Ikuma disse, levando-a consigo. - Hum, o cheiro parece ótimo. Não é?
- Haai! Sopa do que?
Taa sorriu ao vê-los, porém cessou ao ver os cabelos da pequenininha e arqueou uma das sobrancelhas.
- Não achou o pente?
- Ah, provavelmente tinha em algum lugar. - Ikuma deu de ombros. - É sopinha de carne.
- Ora essa. 
Taa disse a ele e passou a mão pelos cabelos da pequena, ajeitando-os e pegou-a no colo e ajeitá-la na cadeirinha que ainda havia ali.
- Ah, ah, Taa, ele pode ser meu papai? Ele disse pra eu perguntar pra você... Eu me comporto.
Taa uniu as sobrancelhas e desviou o olhar ao outro.
- Falamos depois do jantar, gatinha. Não está com vontade de tomar sopa?
Ela assentiu, deixando o ursinho pequeno sobre o colo e agarrou a colher sobre a mesa, realmente estava faminta. Taa serviu a sopa para ela, num pratinho separado, sem o sangue e para si e o outro serviu a sopa diferente, ainda observando-o meio de canto, sem saber ao certo o que dizer. Ikuma sentou-se junto a menorzinha à mesa e experimentou a sopa, buscando logo o pedaço de carne. 
- Hum, ótimo. 
Ikuma fitou o parceiro, embora não pensasse em falar sobre a pequenina tão logo, não em frente a ela. Taa assentiu ao notar o olhar dele e experimentou a sopa, gostosa apesar de ter sido feita por si.
- Oishi. Oishi, pequena?
Ela experimentou a sopa, meio desajeitada a pegar com a colher e abriu um sorriso.
- Oishi!
Taa sorriu a ela, observando seus cabelos negros, agora penteados pelo companheiro. 



Taa ajeitou-a novamente quentinha no próprio casaco, havia terminado de comer e agora estava dormindo de novo, era criança, gostava de dormir, ainda mais sobre um teto e aconchegante, sem medo. Aproximou-se do menor e lhe selou os lábios, deslizando uma das mãos por seus cabelos.

- Ela pode ficar com a gente?
Após o jantar, Ikuma observou a casa, conferindo os itens, se tinha algo legal por lá. Pegou na geladeira algum docinho que serviu a si de sobremesa, pura curiosidade. 
- Nunca comi isso. - Disse, enquanto comia o danoninho com uma colher de plástico. - É gostoso, mas acaba rápido, tinha que ser uns potões, quem come uma dose tão curta dessas? - Disse a ele. Após o término, sentou-se numa das poltronas, observando a pequenina no sofá, coberta e ajeitadinha com um casaco. - Eu imagino que se você quis salvar ela, provavelmente é porque quer ficar com ela.
- É porque isso é pra crianças. - Taa riu a observá-lo e sentou-se em seu colo, abaixando-se a beijá-lo no rosto. - Na verdade eu a salvei porque imagino como deve ser horrível ter que dormir na rua. Pensei que se não quisesse ficar com ela podíamos deixá-la num orfanato... Afinal ela é humana.
- Pra crianças vírgula, eu não sou criança. - Ikuma disse e pousou as mãos em suas coxas conforme se sentou, ouvindo o que dizia. - Você quer ficar com ela?
Taa desviou o olhar a ela, encolhidinha no sofá e abriu um pequeno sorriso.
- Eu quero. Ela parece você, é educada, linda.
- Eu sou educado? Lindo eu já sei. - Ikuma disse e sorriu-lhe com os dentes, brincando. - Mas sabe que ela vai perder os lindos olhos cinzas, certo?
- Sei... Por isso mesmo eu fico tão apreensivo. Ela é pequena, não tem perigo de morrer na transformação?
- Muito provavelmente. Teria que esperar ela crescer um pouco.
- Mas e as crianças?
- Nossos filhos são bem educados, não são mais bebês.
Taa assentiu e suspirou.
- Então... Vamos levar ela pra casa?
- Ok, então vamos.
Taa assentiu e selou os lábios dele, levantando-se.
- Vem.
Ikuma levantou-se logo após ele e observou a pequenina adormecida, buscando-a para o colo. 
- Quer levar ela?
- Iie, quero que você leve, gosto de ver ela no seu colo.
- Que fetiche estranho, lagartinha selvagem. 
Ikuma disse, acomodando-a no colo e logo saiu consigo, deixando a residência que, algum dia, ela viria a morar. Taa riu ao ouvi-lo.
- Lagarta selvagem, é? O que tem eu gostar que você seja pai? 
Saiu com ele do local e usou a chave no chaveiro para trancar a porta, seguindo com ele pela rua.
- Não sabia que você era tipo o Drácula. Virou história, é?
- Gosta de ver eu de papai, ah? - Ikuma sorriu e ajeitou a pequenina, levando-a quase sobre o ombro. - Drácula? - Riu. - Vi o Drácula nascer, meu amor. - Brincou.
Taa riu.
- Ah, claro. Ele sim é uma história pra crianças. Você é tão velho assim? Usava kimono e tudo? 
Mordeu o lábio inferior, tentando não rir. Ikuma riu entre dentes. 
- Uso até hoje.
- Porra... Pré-histórico. Tinha dinossauros?
- Tinha, era o pão nosso de cada dia.
- Ah, imaginei. - Taa riu novamente e mordeu o lábio inferior. - Guardou alguma coisa daquela época?
- Qual, dinossauros ou dos kimonos?
- Qualquer coisa. - Riu.
- Minha casa. Porém, os móveis são sempre renovados, ou melhor, reciclados, eu mando em um tipo de manutenção pra reforçar e continuar com eles.
- Entendi... Mas... Na época já existiam casas subterrâneas?
Ikuma sorriu. 
- Você sabe o que é guerra? - Provocou.
Taa estreitou os olhos.
- Não me chame de idiota.
- Sabe que adoro te encher o saco.
- É, sei
- Ó... Estou te dando um bichinho novo, não me enche o saco.
- Bichinho nada, é sua filha agora, loira.
- Bichinho. Parece um ursinho.
- Um ursinho preto.
- É. Você consegue se controlar com a menina, certo? Porque já sabe que vai sentir o cheiro dela até dormindo.
- Eu sei... Não vou morder.
- Eu fico tranquilo. Os meninos também eu suponho. O que eles quiserem tem na geladeira ou aquecido em algum lugar.
- Não tem problema, também fico bem alimentado... Mas o bebê acaba me deixando meio estranho de vez em quando, com vontade de arrancar as tripas das pessoas na rua.
Ikuma riu e negativou. 
- Claro que sim, tanto que até protegeu a menina
- Pois é, pra você ver. - Taa riu. - Estava bem alimentado.
- E você fica bem alimentado em casa. Fica de rabo cheio, de todas as formas possíveis.
- Não fale assim que eu fico com vontade, filho da puta.
- Estamos indo pra casa, não vai passar vontade.
- Hum, então ta bom. - Taa sorriu a ele. - Como vamos passar com ela pela boate?
- Não é como se eles fossem voar em cima de mim. Vão saber que somos donos.
- Ah, não sei. - Taa murmurou e segurou a mão dele. - Bem, vamos entrar.
Ikuma adentrou a boate, seguindo com a garota coberta. Sabia que provavelmente todos os que não estivessem ocupados o bastante, sentiriam o cheiro, mas não o suficiente para tentar algo contra o que tinha em posse. Após passar pelos clientes, desceu a própria casa sem ter dificuldade e fitou o companheiro, como se lhe desse um aviso mudo. Ao abrir a porta, levou-a diretamente ao sofá. 
- Não é difícil. Não estamos falando de vampiros predadores como mostram em filmes idiotas.
Taa seguiu junto dele, pouco amedrontado pelos vampiros que observavam a si e abriu a porta a dar espaço a ele, ajeitando as almofadas a dar espaço a pequenininha que não havia acordado nem com a música alta.
- Mãe? Ah, que susto, agora há pouco veio um vampiro meio bêbado aqui procurando o papai... O que é isso aí? - Disse o loirinho, aproximando-se curioso do sofá. - Cheira a comida.
- É a filha humana que sua mãe teve antes de nos conhecermos.
- O que?! Sério?
- Não, seu pai está te enchendo o saco.
- Claro, porque ela ficou congelada no tempo enquanto você crescia normalmente.
- Porra pai, não me assuste.
- Na verdade o bebê da mamãe resolveu vir mais cedo.
- Ah vá.
- Não, verdade mesmo. - Taa falou, entrando na brincadeira. - Acabamos de chegar do hospital.
- Eh? 
Takuan, um dos filhos do meio falou a observar a mãe e uniu as sobrancelhas, confuso, ainda mais com os cabelos loiros da pequena, e a mãe não costumava brincar.
- Mas... Desse tamanho?
- Sim, tivemos um problema de gigantismo.
Taa desviou o olhar ao marido e negativou, levando uma das mãos sobre a face.
- Gigan... Mas isso foi hoje? Porque você estava tão magrinho... E... Nasceu de cabelo e tudo?
Taa desviou o olhar ao filho, mais incrédulo ainda e segurou-se para não rir.
- Não olhe assim pra ele, lagarta. - Ikuma disse e afagou carinhosamente o cabelo dos filhos, o abraçando. - Ele é ingênuo.
- Eh? Ah vocês estão me sacaneando! Parem...
Taa riu, sem conseguir conter e colocou a mão em frente aos lábios, abraçando o filho igualmente.
- Eu não fiz nada, poxa...
- Você é fofo. Não sei a quem puxou.
- Hum... Mamãe é fofo.
- Eh?! - Taa arqueou uma das sobrancelhas.
- É, mas sh... - Ikuma disse como se sussurrasse. - Não conte a ele.
Taa estreitou os olhos.
- Hey.
- Mas sério, quem é?
- Ikuma salvou ela de um vampiro mimadinho, estava morando na rua, então trouxemos pra morar com a gente.
- Sua mãe salvou esse criança de um pirralho. E ela estava morando na rua após a morte da mãe, parece que a tia a deixou pra ficar com a casa e disse que buscaria depois.
- Ah... Então ela é órfã? Qual é o nome dela?
- Disse que se chama Sayu.
- Que bonitinho... - Sorriu. - Quantos anos ela tem?
- Quantos anos, Taa?
- Tem cinco...
- Nossa... Posso segurar?
- Não vai acordar ela?
Taa assentiu e abaixou-se ao lado da pequena, puxando o casaco a descobri-la.
-  Hey...
- Eh? ... Onde estamos?
- Em casa, essa será sua nova casa. Vem cumprimentar seu irmão.
- Irmão?
- É, o Takuan.
- Oi pequena, sou seu novo irmãozinho. - Takuan sorriu.
- Oi... - Ela falou baixinho, observando o garoto, curiosa.
- O que achou do irmãozinho, hum?
- Achei que era uma menina...
- Eh? Até ela está me zoando? ... Deus.
- Ela nem sabe o que é isso.
Ikuma riu, e deixou-os por um instante, buscando para si uma dose de sangue na geladeira. Taa deslizou a mão pelos cabelos da pequenininha.
- Acho que vou pro quarto. Foi um prazer conhecer você pedacinho.
Ela sorriu a ele e assentiu, acenando com a mãozinha. Taa sorriu a ambos e pegou a pequena no colo.
- Vamos pro seu quarto.
- Meu quarto?!
- É, vamos decorar ele pra você, o que acha?
- Oba! 

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