Ritsu e Etsuo #35


Um suspiro profundo deixou os lábios de Etsuo, e estava evidente no rosto o modo como o irmão havia acabado consigo, claro, não ele exatamente, havia acabado consigo mesmo. Podia ver os olhares, as pessoas cochichando, não gostava disso. 
- Nossa, o que aconteceu com o Etsu? Parece que não dorme há um ano.
- Sh, fiquei sabendo que ele matou o irmão.
- Sério?
Negativou, seguindo para a cantina, e era a primeira vez que comprava um suco a mais, era o horário da entrada, e o irmão chegaria separado de si, havia ido com os pais para o médico por algum motivo bobo, queriam saber se tudo estava normal nele devido a atual situação. Ao vê-lo, era como se o visse a primeira vez, nossa, ele estava bonito. Os olhos pareciam cintilar na luz, os cabelos estavam compridos, loiros e quase deixou cair o suco. - ... O-onii-chan...
Quando Ritsu chegou estava um tanto tenso, havia pedido sem nenhum recato que os pais deixassem a si na escola, não era do tipo rebelde tímido, tinha orgulho deles. Ganhou um beijo no dorso da mão pelo pai menor, já o maior não se manifestava fervorosamente porém podia ver seu sorriso tênue de onde estava, no carro. Feito isso entrou pela escola e buscou pelo irmão. 
- Etsuo. - Falou baixo, estava um pouco desconfortável. 
Etsuo sorriu a ele, e então caminhou em passos largos, estava ansioso. Entregou a ele o suco que ele gostava, agora, tinha algo extra em sua composição. 
- Você está... Lindo.
O riso soou meio soprado, embora Ritsu estivesse de cenho franzido pelo comentário dele, como se não visse a si há tempos. Aceitou a caixa de suco, achou graça da estampa, a caixa parecia completamente normal, como a de humanos, mas num canto uma gotinha vermelha sutilmente estampada com uma arcada dentária fazia um anúncio. Etsuo sorriu novamente, estava bobo, podia dizer. 
- Nossa, Etsu, quem é seu amigo? Não vai me apresentar?
- Não, Sayu. Vaza. 
- Por quê? 
- Sai!
Ritsu observou-a por um instante, de soslaio, podia não ser nada a ele, mas não ter recebido algum olhar como se fosse um alimento era algo novo. Vê-lo também responder como seu humor habitual, foi algo que gostou mesmo de ver. Sorriu sob o canudo do suco já para a boca.  Etsuo negativou e desviou o olhar ao menor, após expulsar a garota, podia ver de trás a loira e a morena, fitando a si, eram um casal, e era estranho o modo como sempre estavam por perto, pareciam cuidar de si e dele.
- Vamos estar na mesma sala? - Ritsu indagou ao irmão e esperou por ele, pelo que faria a seguir. - É bom que seu humor ácido reapareça.
Etsuo assentiu e desviou o olhar a ele em seguida. 
- Sim, mas você vai aprender algumas outras matérias que eu não vejo, começará do zero... Então... Por favor, não olhe muito para os outros.
- Acha que vão estranhar meu olho manchado?
- Seu olho é lindo. Se estranharem eu arranco os olhos deles.
- Estou perguntando porque disse pra eu não olhar as pessoas. 
Ritsu sorriu canteiro mesmo enquanto tragava o suco.
- Ah... Não, é pra ninguém se apaixonar por você.
- Se alguém se apaixonasse teria um grande problema.
- Sim, eu.
- Você mesmo. Afinal, parece que já formamos nosso akai Ito.
- Já sim, tá preso aqui e não troco. - Etsuo disse num sorriso. - ... Espera você... - Disse e sentiu o sorriso sumir aos poucos dos lábios, dessa vez deixou mesmo a caixinha cair. - Você... Está dizendo que eu sou seu parceiro?
Ritsu arqueou a sobrancelha ao que sua caixinha foi ao chão, pegou-a. Não entendeu em que ele se surpreendeu, achava que já haviam convivido suficiente para isso ou talvez ele estivesse aéreo demais nos últimos tempos. 
- E você já não sabia disso?
- ... Eu achei que não ia me querer mais... Achei que, não como parceiro. Quer dizer, vampiros só tem um parceiro.
Ritsu franziu o cenho ainda assim, sem entende-lo na verdade. 
- Quer dizer que não poderei mais ficar com ninguém além de você? 
Indagou, claro, não estava cogitando de fato a ideia. Etsuo uniu as sobrancelhas. 
- Não...
- Oh, então eu preciso pensar se eu quero fazer o que eu já estava fazendo como um humano. Não seja tolo, você é tudo o que eu quero.
Etsuo sorriu e abraçou-o forte, beijando-o no rosto.
- Eu te amo muito.
Ritsu ergueu o braço apenas para evitar o acidente da caixa de sucos. Sentiu seu abraço e se perguntou como ele pareceria se fosse um humano, era firme, ele já havia se acostumado com a nova condição. Virou o rosto, beijando sua bochecha como ele a si. Etsuo suspirou, não se importava sobre o local onde estava, apesar que não escola, nunca fora muito sentimental, preferia ficar em silêncio e no próprio canto. Venha, venha pra sala comigo.
- Hum, hum. 
Ritsu assentiu e mordiscou seu pescoço antes de solta-lo. Esperou por ele, indo o caminho pelos corredores até a sala e sabia que aquela altura do ano, ia parecer confuso um aluno novo. Etsuo seguiu com ele para a sala, e segurou sua mão no caminho, não se importava com os olhares. Ao contrário do que ele pensava, não olharam estranho, na verdade, as meninas suspiravam quando o viam passar no corredor, a verdade é que naquela altura, não haviam mais tantos nascidos vampiros no mundo, ainda haviam vários alunos na escola que eram assim como ele, transformados. Ao adentrar a sala, os garotos o olhavam com certo desdém, afinal, certamente as namoradas deles pareciam interessadas, eram como animais. Puxou-o consigo e sentou-se ao fundo na sala. 
- Se você se sentir desconfortável ou algo assim, vamos pra casa, tudo bem?
Ritsu seguiu com ele até a sala, eram diferentes, muito diferentes dos colegas de classe, eram mais em seus lugares do que a porção de adolescente barulhentos onde estudava, gostou daquilo. Observou o aspecto tedioso de alguns dos garotos. Mas na proximidade fitou a aluna que seguia até si, parou em frente. 
- Quase parece um Serizawa, eu não conto se você não falar nada. 
Referia-se ela à cor dos cabelos, tinha um sorriso bem delineado e um cheiro que já conhecia. 
- Ikuma...? - Ritsu murmurou e ela sorriu. 
- Meu pai. - Ela sorriu para ela, em retribuição. Não sabia como era o pai dela, não havia acordado a tempo de vê-lo. - A morte passou por seus olhos, não é? - Disse ela mas não como uma pergunta real, era uma breve observação. - Seu braço também.
Etsuo observou a loira e por um momento, quis se levantar, mas manteve-se sentado, embora tenha feito uma breve reverência com a cabeça, a respeitava de alguma forma, sabia que os alunos respeitavam os mais antigos por outros motivos, medo talvez, mas sabia que de alguma ela zelava por si e ele, por isso a respeitava. 
- Shizuka, esse é o Ritsu. Ritsu, essa é a Shizuka, filha do Ikuma.
- Ritsu-kun, só Ritsu? Achei que fosse Ritsuka, como o mangá. - Ela fez o comentário descontraído. - Seja bem vindo, pingado. 
Disse ela enquanto caminhava até sua mesa de volta, ganhara o apelido no primeiro dia, embora não tivesse entendido no início.
- Pingado? - Ritsu perguntou ao irmão.
Etsuo sorriu a ela, meio de canto e assentiu conforme a pergunta do nome do irmão, havia escolhido o nome dele, então se sentiu um pouco constrangido. Desviou o olhar ao menor. 
- Acredito que seja porque seus olhos são assim, quer dizer manchado. Um café manchado de leite.
- Então leite manchado de café. 
Ritsu disse, indicando a pele branca e seguida o braço com a pele um pouco mais escura, embora não fosse nada muito gritante aquela altura. Etsuo sorriu e assentiu, acariciando seus cabelos. 
- Pingadinho. - Murmurou e riu. - Veja, ela faz parte da família Serizawa, acho que já ouviu a mamãe contando as histórias pra mim quando éramos menores. São a família mais antiga do mundo. Os avós dela tem mais de quatrocentos anos.
- Na verdade mamãe mencionou o vampiro que me ajudou a passar o período de transformação, falou que era Serizawa e que ele era muito forte. Comparou ele a um uísque na verdade. 
Ritsu disse e até ponderou sobre a analogia engraçada do pai. Etsuo riu e assentiu.
- Como um uísque mesmo, Ikuma é extremamente forte.
- Que bom que papai o conhecia.
- Hai. O marido dele trabalha com o papai, por isso ele conhecia. Ikuma não ajudaria qualquer um se o Taa não pedisse, você vai conhecê-lo no jantar, ele é bem... Excêntrico.
- Você parece gostar deles. Os admira.
Etsuo sorriu. 
- Eu respeito. É estranho, mas... Shizuka sempre parece estar de alguma forma, observando a gente. No dia em que eu fui salvar você, ela foi atrás de mim para o parque, se eu não chegasse a tempo, ela chegaria.
- Hum, será que ela gosta de você? 
Ritsu sorriu ao perguntar, não enciumado, embora ela não parecesse gostar de alguém, parecia auto suficiente. Etsuo sorriu, achando graça no que ele dizia. 
- Não. Ela tem o "Akai ito" dela. É aquela garota de cabelos castanhos. - Indicou. - É prima dela.
Ritsu olhou com cautela, fitando a garota, que diferente da loira, era quase escondida como uma sombra. 
- Hum, não parecem um casal provável, não é?
Ritsu riu. 
- É. Alguns vampiros tem a mania de ficar com familiares... Os irmãos dela, quase todos namoram os primos, estranhamente da mesma família...
- Não falo da família, mas porque elas parecem diferentes.
- Ah? Ah, em questão de comportamento? Arisu gosta dela apesar de tudo. - Sorriu.
- É, muitas coisas são diferentes do que parecem. 
Ritsu disse e aquilo era uma indireta quase direta. Etsuo desviou o olhar a ele.
- Hum. - Assentiu, silencioso.
- Nani? 
Ritsu indagou, imaginando se havia se incomodado.
- Nada. - Etsuo sorriu. - O suco é bom?
- É gostoso. 
Ritsu disse e pegou a caixinha dele, abriu e indicou que tomasse. Logo a aula começara, na verdade foi mencionado e se perguntava a razão daquilo, uma hora conheceria outros alunos, não precisava da menção. Etsuo assentiu e furou o próprio suco, observando a professora que iniciou a aula, e sorriu, orgulhoso quando a ouviu falar do irmão. Ritsu fitou o irmão de soslaio, teve de sorrir, parecia o próprio pai. Etsuo manteve-se atencioso a aula, embora fosse um pouco difícil agora com o irmão, talvez ele se sentisse um pouco perdido no início, afinal, era três anos mais velho que ele, mas certamente tentaria acompanhar, e ele aprenderia coisas sobre o cotidiano vampírico, história, coisas do tipo, além de claro, suas matérias normais.
- São curiosidades interessantes. 
Ritsu disse ao moreno enquanto andavam pelo pátio, era intervalo e era estranho estar de madrugada na escola e estranhamente muito agradável. Etsuo assentiu a segurar a mão dele. 
- Você vai aprender muita coisa! E eu mal posso esperar pra te ensinar a caçar, como seu corpo funciona e tudo mais.
- Vai ensinar como meu corpo funciona? 
Ritsu indagou e riu baixinho, para si mesmo.
- Digo... Seu corpo novo.
- O que você vai me ensinar?
- Como funciona seus sentimentos, suas vontades, sua fome. - Etsuo disse num sorriso. - Se um dia, me deixar tomar seu sangue de novo, poderá sentir os meus sentimentos.
- Você quer meu sangue agora?
- Sangue de um vampiro, ainda mais do parceiro é muito mais saboroso que o sangue humano.
- É como um afrodisíaco.
- É, eu já sei disso. - Se gabou falsamente. - Mas não tenho mais meu gosto, não vai sentir falta do meu sabor humano?
Etsuo sorriu meio de canto, o olhar era evidentemente triste ao entrar nesse assunto. 
- Não.
- Não parece isso.
- Não vou. Você é meu pra sempre agora. Vou gostar do seu sangue.
- Hum, 'kay. - Ritsu disse e ao esticar o braço afagou sua nuca. - Bebezão.
Etsuo sorriu e abraçou-o igualmente, selando-lhe os lábios. Ritsu retribuiu seu abraço, tal qual o selo que ganhou. 
- Você parece melhor.
Etsuo sorriu e deslizou uma das mãos pelo cabelo dele, acariciando-o. 
- Fico feliz de ver você bem, e claro, que goste de mim de novo.
- De novo? Nunca deixei de gostar.
- Bem, ficou bravo comigo um tempo.
- Mas estar bravo significa que me importo com o que me aflige vindo de você, por gostar de você.
- Eu sei, você tinha razão em estar furioso.
- Mas... - Ritsu disse num suspiro. - Estou me acostumando, parece mesmo que nasci de novo.
Etsuo sorriu. 
- Será muito melhor, não vai ficar doente, não vai envelhecer...
- Eu queria ter crescido só um pouco mais. 
Ritsu sorriu a ele e beijou sua testa, separou do abraço para voltar a andar. Etsuo riu. 
- Você não precisa crescer, é lindo assim.
- Hum, mas nunca vou ficar parecendo um homão igual ao papai.
- E daí? Não é como se precisasse.
- Mas eu gostaria. Vou parecer um menino pra sempre. E você ainda vai se desenvolver um pouco mais.
- Ainda terei essa mesma aparência, eu não cresço mais do que isso, e meus vinte e dois vão chegar logo.
- Não de altura, mas seus traços serão mais maduros que 19 anos.
- Hum, desculpe.
- Não vai se desculpar por toda vida, vai? Porque se for, eu preferia ter morrido.
- Cale a boca, Ritsu.
- Então cale a boca você.
Etsuo estreitou os olhos e assentiu.
- Bom garoto.
Etsuo riu. 
- O que quer comer? A cantina serve comida humana com sangue pra alguns vampiros como você, bolsas de sangue, e até carne crua.
- Vampiros como eu?
- Transformados, que são acostumados a comida humana. - Etsuo sorriu.
- Os nascidos não gostam de comer comida humana? Você come.
- Bem, alguns não gostam, eles preferem só carne crua.
- É uma comida humana.
- Bem... Não carne humana.
- Ah... Que dó.
Etsuo riu. 
- Bem, são como vacas para alguns.
- Parece algo bem desrespeitoso.
- Claro que pra mim você não é algo como isso, nunca seria.
- Eu era seu lanchinho sim.
- Era, mas não uma vaca.
- Claro que não, eu sou rapaz. Sou um boi.
Etsuo riu. 
- Ritsu!

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