Ritsu e Etsuo #27


Etsuo deu um suspiro profundo, a verdade é que estava entediado e tinha que aguentar aquela aula chata de história, não estava nem aí para o que os vampiros de séculos atrás faziam, ainda mais sendo que dois na sala eram filhos de vampiros tão antigos quanto os da história, e sempre eram usados como exemplo, não gostava muito deles, sempre achara que tinham muito o nariz empinado, embora na realidade poderia não ser assim. Havia uma garota de cabelos longos e loiros, ondulados, como fios de ouro, que andava com outra que aparentemente era sua prima, bem, não achava tão errado ficar com o próprio irmão ao ver as duas, se sentia até bem. O irmão... O que estaria fazendo aquela hora? Estaria deitado, dormindo? Sorriu ao pensar nele e encostou a cabeça na mesa, fechando os olhos, estava meio sonolento, mas acordou ao ouvir um barulho alto, não era o professor. Alerta, ergueu a cabeça rapidamente, aspirando o ar, ouvia as asas dos pássaros, durante a noite, aquilo não era normal, e antes que pudesse se levantar, a loira já estava em pé no canto da sala, malditos Serizawa, deviam ser mesmo melhores que os outros vampiros. Desviou o olhar a ela, quase sério demais e a própria professora observava a ambos em pé. Calculou mentalmente a distância até em casa. Ritsu... Não dera explicações, num pulo, saiu da sala pela janela e ali, todos sabiam porque, cheirava a humano, eles podiam ver a si, vendo as fotos dele no celular, sabiam que era humano. Ao deslizar pelo telhado, logo estava no chão, e antes que pudesse começar a correr, sentiu o tremor abaixo dos pés, não, tinha que chegar a tempo, ele não iria pressentir. Correu, o mais rápido que podia, havia virado dois ou três quarterões e podia ouvir as pessoas nas casas, acendendo as luzes, gritando, não era realmente um terremoto forte como já havia visto em filmes, não iria devastar o lugar, mas poderia derrubar um prédio, sabia disso, sentia o chão tremer com força, esperava que em casa estivesse menos pior. Ao chegar em frente ao próprio prédio, sabia que os pais não estavam, as luzes estavam apagadas, pôde ver do andar de baixo, fitou todo o local, pensando num modo de subir mais rápido e dentro do local, pôde ouvir o barulho de coisas caindo. 

- Ritsu! 
Gritou e se jogou para dentro do prédio, correu pelas escadas, o elevador não faria sentido naquela hora. O mais rápido que pôde, estava dentro de casa, quase destruindo a porta da entrada, via os móveis saírem do lugar, podia ouvir o barulho das paredes, não queria ficar sem casa, os pais ficariam tão tristes, mas o que tinha que se importar agora era ele. Rapidamente correu ao quarto e o viu de pé, estava em frente a porta, não tinha tempo para conversar com ele, então o pegou nos braços e rapidamente seguiu para a porta, sabia que ele odiaria ser carregado no colo, sabia que iria ouvir reclamações, mas podia apanhar o quanto fosse necessário, não o soltaria. A força com que o segurava, era muito maior do que todo aquele terremoto. No andar de baixo, só o soltou quando sabia que estavam a salvo fora do prédio e o suficiente afastados. Acariciou os cabelos dele. 
- Você está bem? Está machucado? Está... 
Disse e procurava nele algum sinal de machucado, marca de sangue, qualquer coisa, estava visivelmente desesperado, tão trêmulo que o fazia tremer junto a si se segurasse sua mão, as lágrimas estavam presas aos olhos num choro mudo. Ao constar que ele estava bem, o abraçou, firme, embora não tão forte quanto queria, e escondeu a face em seu ombro, embora ainda sentisse o chão estremecer.
O sono era leve, havia tomado Ritsu no meio de uma leitura e foi com o livro no peito que acordou, enquanto a cama saia em milímetros sendo levada pelo chão. Desperto, levantou-se percebendo a que era acometido, embora não fosse necessário, pensou no irmão. Logo nos pais e então na prateleira que iria cair. Pisou na pantufa que encontrou, era do moreno, o que fazia com que voltasse a pensar nele. Não era assim tão temeroso, mas tinha que sair de lá o mais rápido possível, ainda que não morasse no último andar, também não morava no primeiro. Olhou para trás, depois para a porta, olhou tudo o que podia acabar no chão e tentou ser rápido em joga-los na cama. Quando foi tirar o vidro ao lado da cama, ouviu a porta no entanto. O moreno estava tão tenso, que quase parecia transpirar embora isso não fosse possível para ele. Não teve tempo de deixar mais nada a salvo, acabou em seu colo, era constrangedor, mas sabia que andar o atrapalharia. Quase num salto estavam na saída do edifício, parado próximo ao parque ambiental defronte, não sabia se ele havia se desequilibrado devido a rapidez mas haviam se sentado num canto do gramado, sentindo ainda o intenso tremor sob os corpos. Fitou o moreno, assentiu sob seu olhar analítico e brilhante, brilhante demais, eram lágrimas? Só não viu mais porque se encostou junto ao pescoço e ombro. O abraçou, na verdade meio abraçou e acariciou seus cabelos negros. 
- Estou bem, não sou de cristal. - Beijou seu pescoço onde aparente. - Estou feliz em te ver.
Etsuo suspirou, e podia jurar que o coração batia tão firme que poderia ouvir, estava com medo, muito medo, não era normal um vampiro sentir medo daquele jeito, se fosse um humano, poderia estar morto. Desviou o olhar a ele e assentiu, ainda o segurando firme e voltou-se para cima conforme ouviu o barulho da árvore ruir sobre ambos, as raízes eram grandes, não havia sentido nada se mover abaixo de si, então não se preocupou, mas o que acontecera fora um galho generoso que se desprendeu. Rapidamente se colocou sobre ele, apertando-o entre os braços e o gemido alto deixou os lábios conforme sentiu a madeira cair sobre as costas, não era pesada para esmagar ele abaixo de si, mas o baque com o próprio corpo havia sido seco, se fosse um humano, estaria morto. Abriu os olhos, devagar e observou-o abaixo de si, sentia a dor irradiar nas próprias costas e sentiu na boca o gosto de sangue, ignorou. 
- Você está bem? 
Murmurou e devagar se levantou, as pernas trêmulas e jogou o galho para o lado, ouvindo o barulho dos próprios ossos machucados que voltavam para seus lugares e havia ficado no chão, não conseguiria se levantar. 
- ... Saia... Saia de baixo da árvore... Me... Me deixe aq... 
Murmurou, já não estava mais sobre o irmão, mas segurava sua camiseta, a mão afrouxou aos poucos, estava morto, mas é claro que estava, era um vampiro, havia desmaiado, mas o suficiente para somente despertar se alimentado.
Ritsu o havia abraçado, havia falado com ele, e quando parecia bem no entanto, a situação se mostrou contrária. Praguejou o irmão por se fazer tão heroico, era um vampiro, podia se jogar para o lado com a mesma rapidez com que se curvou, mas não foi sábio o suficiente. 
- Bakaero
Resmungou, estava preocupado, porém também estava puto. Tocou o galho e ajudaria a empurrar, mas era inútil como sempre. Ao vê-lo perder o sentido porém, percebeu que pelo menos inconscientemente havia sido esperto. O meio abraço se devia porque segurava a garrafa que havia recebido da mãe naquele dia, havia tirado do móvel para evitar que se quebrasse e derramasse o conteúdo. Havia ficado como estava, tirando o lacre emborrachado do vidro que isolava o frescor do sangue por um tempo. Não tinha certeza como dar aquilo a alguém desfalecido, desse modo, mesmo sobre o tremor menos intenso porém existente, continuou ali, alcançando com o dedo que umedecia no sangue, desajeitado com a posição desenhou em seus lábios como uma tinta labial, esperando que o cheiro ao menos o atraísse. Penetrou sua boca, tocou sua língua, tentando levar o toque do sangue para ela. Se estava nervoso? Obviamente estava, mas tinha um estado de imponência, que talvez houvesse desenvolvido com o pai, ainda que ele não fosse biológico, até que o visse acordar, não se permitiria abater.
Etsuo sentia o cheiro de sangue, podia sentir todo o cheiro dele, o havia escolhido como parceiro, então o cheiro dele de sangue era mais atrativo para si do que qualquer outro no mundo. Estremeceu e havia despertado, os olhos amarelos claros, quase nublados observavam o irmão, e talvez ele nunca houvesse visto a si daquele modo. O próprio sangue se misturava ao dele no interior da boca, não sabia de onde aquele sangue havia vindo, então se desesperou. 
- Ritsu, não! Você cortou o dedo?! Tire! Tire de perto do meu sangue! 
Falou, e ainda se contorcia de dor, não conseguiria levantar, o corpo se contraía e fechou os olhos com força a abaixar a cabeça.
- ... Ah...
- Koibito...  - Ritsu disse evidentemente aliviado, ainda que seus olhos se parecessem com os de um peixe morto, ao menos havia desperto. - Calma, eu trouxe do quarto, foi o que eu consegui trazer. Tome, eu tirei hoje. 
Disse e mostrou o curativo no braço. Ergueu desse modo o recipiente, dispondo junto a sua boca. 
Etsuo desviou o olhar a ele, agora mais calmo, evidentemente e assentiu, não reclamou, silencioso alcançou a garrafa e bebeu um gole da bebida, quase chegou a fechar os olhos como uma criança com a mamadeira, sentir o gosto dele, era tão gostoso, tão doce, era tudo que precisava. Aos poucos, os olhos voltaram a coloração normal, o amarelo aceso e o vermelho manchado, e estranhamente, eles tinham aquele mesmo brilho, silenciosamente estava feliz por saber que ele havia tirado sangue para si, para um vampiro, dar seu sangue ao outro era como uma grande prova de amor. Podia sentir, devagar, os ossos estalarem nas costas, estavam voltando a seus devidos lugares, estavam se reconstruindo e os órgãos mórbidos e danificados, também se curavam. Devagar, se levantou, aliás, engatinhou até ele e usando a tampa, fechou a garrafa antes que bebesse tudo, queria guardar um pouco dele. Abraçou-o, firme novamente e beijou-o no topo de sua cabeça.
Ritsu sentiu o beijo, daquele modo se deu conta de que ele estava mesmo bem. Seus olhos pareciam novamente providos da vida que ele não tinha exatamente. O abraçou, desviando do seu aconchego para dar aconchego a ele. O abraçou dando descanso no próprio peito, onde ele gostava de estar, ouvir, enquanto o apertava, firme, não o machucaria mesmo. 
- Tenha cuidado.
Etsuo sentiu o aperto dele, seu abraço e aconchegou-se junto a ele, só então havia percebido que os tremores haviam parado, estava tudo calmo, tudo estava bem, mas estava chorando, e nem havia percebido também, havia retribuído seu abraço. Ritsu o apertou, beijou sua cabeça. O que ele não sabia é que era cuidadoso demais. Havia crescido para ser daquele modo, havia crescido para ser estável e pensativo demais, porque para os pais assim como para ele, era sensível demais, frágil. Beijou sua cabeça, vendo-o tão chateado, se perguntava porque ainda não havia pedido aos pais para ser como eles, se fosse, não faria-o se sentir tão vulnerável. 
- Está tudo bem. Me dê um beijo. 
Disse ao beijar sua bochecha fria, que era o que alcançava. Etsuo assentiu ao ouvi-lo, erguendo a face e selou os lábios dele, num beijo sutil, limpando as lágrimas que escorriam pela face.
- Ah, mas é um bebê. 
O loiro disse baixo, sentiu no entanto o gosto tênue de sangue, não o suficiente mas o que dava uma lembrança dele, não era bom. Tocou seu rosto, acariciando. 
- Bebe tudo, eu te dou mais depois. Fique forte.
Etsuo assentiu e pegou a garrafa, observando-a. 
- Você sabia que para um vampiro o que demonstra mais amor no mundo é dar seu sangue a ele? É oferecer? Significa que seu bem mais precioso é dele. - Murmurou e segurou a mão dele. - Eu arrancaria meu coração e daria a você se fosse possível. - Disse e beijou-o em seu rosto. - Não sei o que faria se algo tivesse acontecido com você.
- Não, meu bem mais precioso não posso dar a você, como eu poderia te dar a si mesmo. - Ritsu disse e deu a ele uma piscadela, tentando tirar a tensão do moreno. - Nada vai acontecer, você sempre me encontra.
Etsuo assentiu e segurou as mãos dele, ainda um pouco trêmulo e beijou-as algumas vezes. Ergueu a face, fitando a morena em pé atrás dele, a reconheceu, embora silencioso, era da própria sala e apenas fez um movimento com a cabeça, a viu desaparecer em seguida, fora uma questão de tempo para que a mãe chegasse correndo.
- Ritsu!? Ritsu! Você está bem?!
Ritsu tentou olhar para trás, curioso sobre a expressão do irmão, mas não foi capaz de ver. No entanto, viu a mão que avançou como um pequeno gavião. 
- Mãe, está tudo bem. 
Disse para tranquiliza-lo. Ainda agarrava o irmão em sua cabeça.
- Tem certeza? Você se machucou? Etsuo se machucou? Está tudo bem?
- Sim mamãe, tudo bem...
- Eu vim correndo assim que senti você. O que houve? O que aconteceu? 
O galho caiu em cima de mim, Ritsu me deu o sangue dele, eu estou bem.
- Que susto você me deu... Eu... Achei que tinha perdido você. Nunca mais me assuste assim.
Etsuo uniu as sobrancelhas e assentiu, segurando a mão da mãe e atrás dele viu o pai parado, ele sabia que era um vampiro e não se machucaria tão fácil.
- Ele não provocou o terremoto, mãe. - Ritsu brincou com ele, tentando descontraí-lo como com o irmão. - Estamos bem. 
Dito, olhou o pai que sorriu atrás do menor em retribuição. Entendia porque ele estava observando, era pelas razões que também tinha. Sentiu-se orgulhoso. 
- Deixe eu te levar, bebezão.
Etsuo ergueu a cabeça a observar o pai e assentiu, embora se sentisse constrangido por ser pego no colo, deixou que ele o fizesse e observou o irmão, vendo a própria mãe ajudá-lo a se levantar.
- ... O perdemos por alguns minutos. - Disse Shiori a Ritsu. - Eu parei de senti-lo.
- Eu sei, a pancada foi forte. 
Ritsu dizia enquanto com a mãe seguia para dentro do edifício enquanto via o pai levar o moreno, podia ver seu constrangimento e com isso acabava sorrindo a olha-lo, mesmo que falasse seriamente com a mãe ao lado.
- Mas eu estava ali, daria todo meu sangue a ele se precisasse. Seria apenas uma troca no fim das contas. - Sorriu a ele. - Ele me ajudou a estar aqui hoje e eu faria o mesmo por ele.
Shiori desviou o olhar ao filho e sorriu, ajeitando os cabelos dele como tinha costume de fazer. 
- Bem, ele deu a vida dele por você, então... É recíproco. 
Ele sorriu, e achava o pequeno romance dos filhos algo lindo, fazia lembrar a si da própria vida com Kaname.

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