Reika e Takatsuki #23


Takatsuki se sentava na arquibancada, e fazia aquilo com certa frequência até mesmo no outro colégio. Gostava da luz e da calmaria, já que era longe o suficiente da quadra no andar de cima e ninguém se atrevia a ficar ali. O local era aberto, o céu tinha poucas nuvens, mas o suficiente para cobrir a luz do sol. O livro estava no próprio colo, como sempre e lia distraído, quando ouviu o pequeno barulho ao lado de si, uma bolinha de papel. Arqueou uma das sobrancelhas e desviou o olhar abaixo, de onde vinha a pequena bola, e viu o rapaz ali parado. Sorriu, meio de canto e levantou-se, fechando o livro. Não tinha muito interesse nele porque gostava da amiga, mas ela não estava mostrando muito interesse em si nos últimos dias, talvez voltassem a ser apenas amigos de novo, paciência, teria que aprender a lidar e seguir em frente. Ao descer, sorriu ao rapaz, observando-o e fez uma pequena reverência em cumprimento.

- Não precisa ser formal comigo, Takatsuki. Como você está?
- Estou bem. - Sorriu. - Você parece bem também.
- É, eu estou. Estava passando, vi você sentado e pensei em te chamar para tomar um café, alguma coisa assim. 
- Ah, um café? Claro... Mas...
- O que? Você tem aula agora?
- Iie... É que eu tinha marcado com uma pessoa.
- Sua amiga? Ela pode ir com a gente outro dia. Eu gosto dela.
O menor assentiu e sorriu a ele, meio de canto, abaixando a cabeça.
- Não fique tímido, hum.
Takatsuki o ouviu e sorriu meio de canto, porém logo sentiu sua mão no próprio queixo, erguendo-o e o observou, seus olhos bonitos e castanhos e por um tempo não soube o que dizer a ele, ele parecia gentil, mas provavelmente, só era igual aqueles garotos que havia transado antes. Por um momento, se distraiu e logo sentiu os lábios dele se colarem aos próprios num beijo sutil, que sem ter o que fazer, apenas sentiu, confuso.
Reika seguiu ao vestiário após a aula de esporte, nos últimos dias havia passado bastante tempo no clube devido aos jogos entre os colégios que deveriam ocorrer em breve. Tomou banho rapidinho por lá mesmo, vestiu as roupas e aproveitou para dar uma conferida nas meninas do vestiário que acabavam entrando na brincadeira. Após se vestir ainda tinha os cabelos um pouco molhados e levava consigo a toalha que optou por não deixar no armário, sacolejava-a nos fios úmidos enquanto acomodava o tecido em torno do pescoço, aproveitou até para ricochetear o toalha num estalo contra o traseiro de uma das meninas que saltou num gritinho e correu antes que pudesse receber o mesmo. Havia combinado anteriormente alguma coisa com o amigo, não lembrava bem o que era mas sabia onde encontrá-lo em maior parte de seu tempo. Teria passado no quarto antes a fim de descarregar por lá a bolsa onde as roupas da aula e a toalha que agora portava acima da mala, entre suas alças, mas o encontraria antes já que havia demorado um pouco mais que o previsto. Seguiu até a biblioteca e sem encontrá-lo, imaginava que estaria ou na escada ou na arquibancada, procurou em um e deduziu estar noutro lugar, quando finalmente alcançou a quadra notava-o novamente acompanhado, talvez nem precisasse ter sido tão rápida para encontrá-lo e pela proximidade que estavam, aquela não era uma conversa tão simples. Suspirou e nem conseguiu se surpreender, ao se encostar por um momento, cruzou os braços a fitá-lo não como quem tinha raiva, mas como alguém que esperava conformada. Conformada por saber que aquilo já não era tão normal quanto antes, e também conformada por saber que era certo daquele modo, ele era gay e não uma mulher, um bissexual ou mesmo um heterossexual, ele gostava daquilo que estava tendo agora e de certo modo, ele parecia muito melhor com um rapaz do que pareceria com uma garota. Encostada ali observou o amigo, esperando-o terminar o que fazia ou esperando pelo menos se fartar da situação e conseguir provocá-lo.
Ao sentir o beijo, o menor não sabia exatamente como agir, era estranho. Ele era muito bonito, mas sentia aquele aperto no peito que havia sentido com o outro garoto na noite do baile, não deveria estar ali, não deveria estar com ele. Uniu as sobrancelhas e afastou-se aos poucos, empurrando-o suavemente em seu peito, sem força, indicando que se afastasse.
- Tudo bem?
Assentiu, abaixando a cabeça, meio tímido.
- Eu... Meio que sou comprometido. 

- Ah... Me desculpe.
- Não, tudo bem... Acho que... A outra pessoa não se importa tanto comigo assim.
- Hum... Quer ir ao meu quarto hoje? Podemos conversar.
- Iie... Podemos nos encontrar na biblioteca amanhã se quiser. Me desculpe.
Takatsuki falou a ele e sorriu, não queria ir ao quarto, justamente por saber de suas segundas intenções e ao vê-lo se afastar, ajeitou os cabelos, negativando consigo mesmo a abaixar a cabeça.
Reika continuou por lá, mesmo após vê-lo estar sozinho. Os braços se cruzavam em frente o peito e descansava a cabeça contra a parede onde se acomodou. Queria ser vista, queria que ele soubesse que o havia visto, ainda que no fim aquilo não fosse resultar em nada. Mas quando te
ve finalmente seu olhar percebido, deu-lhe um sorriso de canto, um pouco afiado talvez. 
O moreno ergueu a cabeça, e voltaria para o quarto para esperá-la, quando finalmente a viu ali, encostada e uniu as sobrancelhas. Caminhou em passos mais rápidos em direção a ela e quando se fez próximo abaixou a cabeça, culpado pelo que havia feito.
- Desculpe, Rei.

- Desculpar o que?
Ela indagou tão rápido quanto ele caminhou para si e desencostou-se por fim, fitando o amigo já de perto, até o xingou mentalmente.

- Você viu, não viu?
- Vi, e daí?
- ... Eu disse a ele que eu tinha namorado.

- Mal chegou e já tem um namorado, ah?
O menor desviou o olhar a ela e uniu as sobrancelhas.
- Você é meu namorado.

- Ah sim, claro que sou. - Ela disse e embora estivesse sem humor, tentou não transparecer.
Takatsuki desviou o olhar, abaixando a cabeça e por um segundo, sentiu o coração apertar, sem saber o que dizer a ela, já havia falado que gostava dela, então não tinha muito mais o que acrescentar, ela parecia mesmo não gostar de si, e isso era o que destruía a si cada vez mais.
- Sei que não gosta de mim, e sei que isso já foi longe demais, então eu vou falar pra você, porque... Não consigo mais. Começamos como uma brincadeira entre nós dois, fazer amor, nos tocar, brincar, você me dar prazer e por fim, terminou que eu passei a gostar cada vez mais de ficar perto de você. Naquela noite... No baile, eu fui para o quarto com outro garoto sim, mas não por causa do Jun, eu fui por sua causa, porque eu queria ficar com você, dançar com você e você tinha outra pessoa. Falei com ele sobre isso, disse que não aguentava ver quem eu gostava nos braços de outra. Ele me convenceu a ir pra cama com ele, e de fato, ele era bom, mas não era você, foi por isso que eu simplesmente levantei e fui embora. Te ver com a Mei, todo dia, todo tempo... - Fez uma pausa, e somente porque não aguentou as lágrimas que 
deixaram os olhos, enrouquecendo a voz. - Isso me mata... Olhar pra você, saber que você não me quer, que não quer me tocar, mesmo depois de eu ter saído da escola e vindo atrás de você. Mesmo depois de ter deixado tudo por você, mesmo depois de tudo, ver que você ainda nem olha pra mim de modo diferente... Eu tentei voltar e agir igual, mas não consigo... Então vou voltar pra casa.
Ele falou a ela e negativou, sem conseguir se conter e passou ao lado dela, seguindo ao quarto.

Reika fitou o amigo, ouvindo tudo o que passou a dizer. Fora pega de surpresa é claro, porém ainda assim continuou a fitá-lo um pouco afetada pelo sentimento anterior. Haviam passado algum tempo juntos desde sua vinda, claro que sentia que a amizade fluía coma antigamente, imaginava que talvez simplesmente houvessem estragado o clima entre ambos, numa simples amizade e não porque talvez haviam levado aquilo tão adiante. Lembrava-se do que dissera quando estiveram juntos, mas pensava que talvez ele estivesse confuso, afinal havia gostado do sexo que tinham, mas antes de irem pra cama, eram vistos somente como bons amigos, atrevia-se a dizer quase irmãos. Foi tirada do pensamento ao ouvi-lo falar sobre o baile, revelando o que havia acontecido naquele dia. Fitou-o boquiaberta, era o melhor termo a dizer ainda que o queixo estivesse no lugar, mas não disse nada a ele, sentia-se idiota mas ele era ainda mais idiota que si mesma e somente protestou quando o viu dar as costas para si, esticou-se a segurar seu braço, odiava seu modo de sair após uma discussão, odiava ainda mais a forma como estavam agindo entre si, porque não era esse o tipo de tratamento que tinham, não era aquela amizade afastada ou aquele jeito melancólico que ele tinha.
- Não vire as costas para mim, Takatsuki, não cuspa palavras e saia correndo. - Disse e puxou seu braço, fazendo-o se virar defronte. - Você é gay, Takatsuki, e você fica lindo nos braços do seu novo amigo, não tenho o que você precisa então não se engane porque consegui te fazer gozar.

O menor sentiu o puxão no braço, e era forte, mas ela parecia ser mais do que a si para simplesmente puxar e segurar a si daquele modo, sem conseguir se soltar. Observou-a, estreitando os olhos ao ouvi-la e negativou.
- Eu não sou gay. Já descobri isso há alguns dias. Eu gosto de você, se isso me faz hétero, então eu aceito. E não seja estúpida, não iria gostar de você só porque me fez gozar, não sou tão raso quanto você acha que eu sou, Reika.

- Então me explique porque não gostava de mim antes de comer você. - Ela retrucou o amigo e bem, embora dissesse isso a ele, sabia que não era diferente dele.
- Não é comer, é se tocar mais intimamente, de forma diferente. Você nunca me beijou, nunca me deu passagem para imaginar você de outra forma. Como pode ser tão superficial assim?
- Eu sou superficial? - Indagou pasma.
- O jeito como está falando é.
- Bom, não era eu quem estava beijando o cara na arquibancada dizendo gostar de outro alguém.
- Não fui eu que beijei ele, idiota, foi ele quem me beijou!
- Mas levou um tempo até interromper. Estava testando se ia rolar?

Takatsuki arqueou uma das sobrancelhas.
- ... Eu estou confuso, porque a pessoa que eu gosto, age como uma imbecil.

- Ah, eu sou imbecil? Vai querer dormir na minha cama, vai.
Disse ela, aquela altura, já dizia sem realmente falar sério, embora estivesse visualmente séria. Havia perdido aquela discussão, só aquela, e não sabia o que dizer e não sabia se era por estar sem graça, feliz ou aborrecida com alguma coisa, estava confusa como ele, mas deu de ombros por fim.

O menor negativou a ela enquanto a observava e por fim soltou o braço, virando-se a seguir em direção ao quarto, de onde nem devia ter saído no início do dia.
- Pare de fazer isso, porra! - Disse e voltou a puxá-lo. - Pare de virar as costas e sair. Pare de agir feito uma menininha.
Takatsuki uniu as sobrancelhas ao sentir o puxão e voltou a observá-la, sem saber o que dizer.
- E o que quer que eu diga, Reika? Você tem alguma coisa pra dizer pra mim? Porque não parece, e eu tenho uma mala pra arrumar.
- Não quero que diga nada, só pare de dar as costas e sair. Não tem porra de mala nenhuma, Takatsuki, quantas vezes nós já discutimos? Vai embora pra onde seu palhaço? Não é tão fácil sair da escola a hora que quer e conseguir entrar noutro colégio a essa altura do ano, apenas pare com isso. Já brigamos antes e mesmo assim você veio até aqui.

- Não consigo mais, Reika. Sabe por que eu não consigo mais? Por ver que eu me doei, me doo pra você até demais, e só vejo um sorriso debochado no seu rosto no fim do dia, me chame de palhaço, me chame de estúpido, mas eu quero você, e se eu não puder ter, prefiro ir embora do que ver você com outra Mei de novo.
- Você é muito dramático e não sei como ficou assim, acho que tem uma mulher dentro do corpo, Takatsuki. Está se doando em que? Me diga quais foram seus sacrifícios além de mudar de escola. Não é assim, Takatsuki, não é você que se doa o tempo inteiro, ninguém aqui está se doando por nada, estamos só simplesmente sendo amigos e se cuidar um do outro significa se "doar" demais, então você não está sabendo o que é ter um amigo. Tudo que faço por você e faço por vontade de te fazer bem e não por achar que estou me doando demais. Você vai poder me xingar de palhaça se quiser e de estúpida como também sabe fazer, porém eu vou rir porque eu sei que no fim do dia nós rimos. Como agora, que eu nem sei porque continuamos falando dessas merdas ao invés de simplesmente conversar ou comer alguma coisa juntos, ou fechar seus olhos e te colocar dentro do banho feminino. Pare com isso, pare de virar as costas porque está estressado ou triste, não tem nada que não possamos arrumar se estivermos juntos, não seja idiota, não faça todo esse papelão porque você não é esse otário melancólico que está parecendo. Vamos, tente se lembrar de como nos tornamos amigos. E no fim, pare de achar que sabe sobre mim porque você não sabe, você acha que sabe de alguma coisa, mas se soubesse, não estaria dando essa porra de costas que eu vou esfaquear se eu ver mais uma vez, achando que eu não ligo pra você quando eu nunca deixei de pensar em você desde que cheguei sozinha aqui, mesmo depois de você agir feito um tarado naquele quarto, eu queria te dar um soco mas mesmo assim toda coisa boa que acontecia comigo você era a primeira pessoa a quem eu queria compartilhar e se eu não podia fazer isso, o que era bom não era tão importante assim. Agora pare e não me obrigue a dizer essas coisas porque você é uma bicha sensível.

Takatsuki uniu as sobrancelhas ao ouvi-la e assentiu, ouviu tudo aquilo sobre a amizade de ambos, tudo que já sabia, e se magoava ainda mais, por saber que nada daquilo era o que queria ouvir. "Friendzone" pensou. Negativou consigo mesmo, sem saber mais o que dizer a ela, irritado, na verdade, queria poder dar um soco naquela cara bonita dela, porque gostava dela, gostava e falava aos sete ventos o que sentia, para ser retribuído com um "pare de pirraça e vamos rir, nos abraçar e agir como se nada tivesse acontecido". Negativou mais uma vez, sem saber lidar com os próprios sentimentos e assentiu apenas, aceitando ser o trouxa que ela queria, como sempre.

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