Kaname e Shiori #33


Kaname voltou-se ao moreno com evidente incredulidade e espanto. As íris cinzas ficaram em evidência e enrubesceram na vista e cheiro do sangue tingindo sua roupa. Um novo ruído soprou da garganta, porém fez-se impossibilitado de perseguir o assaltante, visto que agora segurava o moreninho no colo, ao caminho do edifício, a busca de escondê-lo nos braços como quem dormia, evitando o serviçal na entrada, que igualmente parecia alerta pelo tiro e sem paciência pelo elevador, seguiu em passos duplos a subir as escadas até o próprio piso, e andar depressa até a residência que adentrou e o levou para a cama.
- Não pode tomar sangue agora, provavelmente vai se fechar mais rápido assim, e vai deixar a bala aí dentro.
Levantou-se e buscou no armário qualquer bolsa de primeiros socorros. O álcool na dispensa da cozinha e algodões. Sentou-se à beirada e deixou o necessário ali. Voltou-se ao seu casaco que tirou como pôde, assim como sua blusinha vestida. Observou o orifício que se retraía e recomponha a estrutura da cútis, estreitando em seu corpo perfurado o espaço que armazenava a bala 
e com álcool jogado na mão, não houve alternativa a que introduzisse a pontinha do dedo, evitando de sê-lo fechado, de modo que manejava a maleta que por sorte havia levado, noutra das mãos, buscando a pinça. E retirou-se daquela pequena cavidade, limpando o acessório médico com álcool. E com bisturi tocou sua pele, formulando mais espaço na abertura contraída.
- Precisa segurar, Shio. - Murmurou afável, de modo que buscou tranquilizá-lo. - Será rapidinho, e não pode gritar senão vão ouvir.

Shiori encolheu-se nos braços dele, agarrando a blusa do outro com ambas as mãos e a apertava com força, tentando controlar-se para não gritar quando passavam pela recepção e subiam as escadas. Tinha a vista pouco embaçada e só conseguia enxergar os fios pretos do cabelo do outro que voavam ao redor de si conforme ele pulava os degraus, o restante era só o tom cinza da parede das escadarias. Ao entrar em casa, logo sentiu a cama abaixo de si e ajeitou-se, ajudando-o a retirar as próprias roupas. Gemeu alto de dor ao acomodar o corpo ali e a respiração ofegante mostrava ao outro ainda mais como doía, deixando escapar pequenos gemidos manhosos entre os espaços da mesma.
- Kaname... Está doendo muito...
Murmurou  ao observá-lo concentrado a observar o local e gemeu alto, quase um grito ao senti-lo pressionar o local com o dedo, sentindo a pele se abrir novamente e a bala ser pressionada no local.
- Kaname! P-Para... Ah!
Gemeu novamente e uniu as sobrancelhas, as lágrimas pequenas escorrendo pela face e molhando o travesseiro abaixo de si. O pequeno corpinho que agora estava a mostra tinha a 
pele arrepiada pelo frio que fazia, mas não o sentia ao todo, nem poderia. A única coisa que sentia era a dor insuportável do ferimento aberto. O bisturi cortou a pele e novamente gritou, embora tentasse conter, nunca havia sentido tanta dor antes, ou talvez a dor fosse quase a mesma das pernas quebradas no dia do acidente e como teve que carregá-lo para casa mesmo assim. Desviou o olhar até a face dele ao ouvi-lo falar consigo e assentiu apenas, devagar com os olhinhos cobertos pelas lágrimas e apertou com força o lençol da cama ao lado de si, virando o rostinho e mordeu a fronha posta no travesseiro.
- Pense em algo bom e desvie-se da dor mesmo que a sinta.
Kaname ditou e umedeceu o algodão no álcool, passando em sua ferida que misturou em seu agradável cheiro. A pinça limpa segurou noutra das mãos enquanto a que livre, pousou em seu abdômen ferido, afastando as extremidades da abertura, a fim de espaçá-lo e inseriu o objeto cirúrgico, sentindo-o roçar no intruso em seu corpo. Abaixou-se perto de sua pequena estrutura física e nua, beijando-o em sua pele em busca de lhe prover num mínimo de conforto. Agarrou com as finas pontas da pinça, puxando vagarosamente o objeto de alguns milímetros e tirou-o a soltá-lo sobre a cama, voltando-se ligeiramente à ferida que se fez em mais sangue e estancá-la a apalpar o tecido fofo de uma fina toalha. Levantou-se e seguiu para a cozinha, onde pegou uma daquelas bolsas plásticas refrigeradas em armazenamento do sangue roubado do hospital e ao voltar-se para o quarto, tirou a toalhinha de seu ferimento e perfurou o recipiente do sangue, deixando-o gotejar do líquido sobre o machucado do pequenino. E parcialmente se deitou ao seu lado, fosse igualmente um 
pequeno reconforto, enquanto o sangue humano doado o provia de um tipo atípico de anestésico.
- Já vai fechar, vai parar de doer. - E com a carícia em seu rosto, chegou a sujar-lhe a branca pele de seu próprio sangue.

O menor assentiu novamente ao ouvi-lo e fechou os olhos, pressionando-os com certa força a mantê-los fechados e abafou o gemido contra o travesseiro ao senti-lo adentrar a própria carne com a pinça, doía tanto que se o outro pedisse a si para descrever a dor, não poderia. Sentiu os beijos pela pele e abriu os olhos aos poucos, soltando o travesseiro e conseguiu abrir um pequeno sorriso para ele, por mais difícil que fosse de suportar, tentava manter-se acordado e piscava algumas vezes para recuperar a vista embaçada. Ao senti-lo retirar a bala, pensou que ficaria mais tranquilo, porém não ficou, o sangue que deixava o corpo só causava mais dor a si, enfraquecendo o corpo que precisava dele para funcionar. Apertou pouco mais o lençol e sentiu-se fraco para continuar apertando-o, como se as próprias forças tivessem sido roubadas de si. Mesmo que não sentisse calor nem tivesse muita temperatura corporal, o suor era evidente no próprio rosto em pequenas gotas, talvez a força que tinha feito para suportar a dor, ou a ansiedade que sentiu. Aos poucos, conforme o outro derramou o sangue, sentiu a dor diminuir, esvaindo-se aos poucos, mas o aroma que corria pelo quarto dava ainda mais fome a si. Queria tomar do sangue, mas não tinha forças pra pedir, mesmo que abrisse os lábios, a voz não saía e pela agonia de não poder falar com ele, sentiu a outra lágrima escorrer pela face. Virou-se sutilmente na direção dele e ao sentir o beijo apenas assentiu, tentando retribuí-lo em seu toque.
O maior voltou-se ao ferimento e aos poucos via-o tornar a pele mais densa, logo fecharia. Observou seu choro contido e o afagou os cabelos, logo limpando aquela única gota. Pegou a bolsa ainda cheia do sangue, e onde seus pequenos furos abertos, encostou na boca do pequeno, apertando o recipiente que gotejava vagarosamente o líquido em sua boca.
Shiori observou-o aproximar a bolsa de sangue de si e abriu a boca, devagar, fechando os olhos ao sentir os gotejo do sangue tocar a língua. Esticou-se pouco mais e sugou o sangue da bolsa, como pôde mesmo ainda fraco. Kaname permaneceu a ajudá-lo daquela forma, deixando-o sorver da bebida, até que estivesse nutrido por ela, o suficiente.
O menor suspirou e já havia sugado quase todo o sangue da bolsa quando decidiu recuperar o ar, mesmo que não precisasse respirar, faltava. Ajeitou-se na cama e desviou o olhar ao outro, a boca suja pelo líquido vermelho que escorria até o queixo.
- Encheu? - Kaname indagou e limpou o rastrinho de sangue de sua pele.
- H-Hai... - Falou baixinho.
- Descanse agora.
- Iie... Quero que fique comigo...
- Eu vou ficar, mas tem que descansar pra ficar melhor.
Shiori assentiu e suspirou, porém logo ouviu o choro baixinho no outro quarto, vindo pela babá eletrônica.
- Kaname...

- Vou ver meu menino, hum?
- Hai... Traz ele...
- Trarei.
O maior levantou-se seguindo ao quarto do bebê, abriu a porta e ouviu aquele mesmo chorinho, baixo e tão gostoso de ouvir. Caminhou ao berço, notando seus movimentos vagarosos e tomou-o do leito ao colo, aconchegando-o nos braços.
- Papai está aqui.
Shiori abriu um pequeno sorriso ao ouvir o outro pela babá eletrônica no quarto e o choro do bebê pequenininho cessar.
- Por que está chorando? Está com fome de novo, bolinho? - Kaname murmurou e segurou uma das mãozinhas do bebê, sentindo-o agarrar o próprio dedo, e beijou-o mesmo assim. - Era colo que você queria.
Tornou dizê-lo baixinho e acomodou-o contra o peito, acariciando suas costas curtinhas com a ponta dos dedos. Shiori m
anteve o mesmo sorriso no rosto e ajeitou-se na cama, puxando sobre si a coberta macia e grossa, cobrindo devagar o próprio corpo ainda machucado.
Kaname deixou o quarto, levando consigo o bebê já quietinho no colo, embora ainda estivesse acordado e ajeitou-se na cama, ainda o portando sobre o peito quando deitou. O menor sorriu ao ver o outro entrar e observou de pertinho o bebê nos braços dele.
- K-Kaname... Posso te pedir uma coisa?

- Hum?
- Eu... - Sentiu a face se corar sutilmente. - Estou sujo de sangue... Pode... Pegar uma toalha pra mim, por favor?
- Pela forma como iniciou eu achei que ia pedir algo sexual.
- Ah... - Shiori observou-o e uniu as sobrancelhas. - Mas... Não com o bebê aqui... Ne.
- Se corou todo pra pedir. - O maior ditou a levantar-se e ainda assim levar o pequenininho ao buscar a toalha e trouxe-a ao outro. - Aonde quer limpar?
- No lugar da bala... - Murmurou.
- Não se preocupe, melhore e vamos pro banho.
- É que... Não queria que ele me visse sujo de sangue. - Murmurou e riu baixinho.

- Ele gosta de sangue, não vai se assustar.
Shiori assentiu e moveu-se na cama a ajeitar-se e gemeu ao sentir a dor do corpo.
- Ah...
Uniu as sobrancelhas e viu o pequenininho se mexer nos braços dele, encolhendo-se e novamente iniciou o choro baixinho.

- Fique quietinho. Sua recuperação é tão lenta, hum? Já deveria estar melhor, tomou sangue, precisa de mais?
O maior indagou e voltou-se ao filho, afagando-o em suas costinhas estreitas, assim como proveu o moreninho de carinho, porém em seus cabelos. Shiori a
ssentiu e deitou-se, ajeitando-se.
- Iie, estou bem... Quando eu perco muito sangue, sinto minhas pernas doerem como daquela vez... - Murmurou. - É horrível... Mas... O que ele tem?

- Eu não sei, talvez esteja com algum desconforto...
- Eh? Deixa eu...
O menor esticou uma das mãos e gemeu baixinho novamente ao sentir a sutil dor no local, chata pelo tempo que estava levando para passar e novamente viu o filho chorar pouco mais forte. Uniu as sobrancelhas a observá-lo e abriu um pequeno sorriso em seguida, quando finalmente havia entendido.
- Eu... Não te contei sobre os sentimentos, não é?

- Hum, acho que não.
- Quando nós tomamos o sangue de alguém, sendo vampiro, essa pessoa pode sentir os nossos sentimentos também. É por isso que quando... Fazemos amor... E eu bebo o seu sangue posso sentir tudo que você sente e por isso fico mais... Mais excitado... Porque sei que está sentindo prazer comigo. Se você sentir dor, eu vou saber e também vou sentir sua dor. Talvez... Você não sinta isso muito bem por ser mais novo... E ele, chora quando eu me movo e sinto dor. Como ele é pequenininho, acho que ele ainda está bem próximo de mim, que sou mãe dele... E mesmo sem o sangue ele ainda pode me sentir... Então... Acho que ele chorou... Porque sabia que eu estava sentindo dor...

- Ah... - Kaname murmurou associando as palavras, assimilando-as. - Então eu vou passar a sentir você também?
- Vai sim. E quando eu precisar de você ou me sentir triste... Você vai saber sem ter que perguntar.
- Hum... Parece bem íntimo.
- Isso é ruim?
- Não sei se é. Mas então provavelmente ele está se sentindo mal, já que sentiu quando tomou o tiro.
- Hai... - O pequeno murmurou e observou o pequenininho, erguendo uma das mãos e deslizou pela cabecinha pequena dele. - Mas está tudo bem... Vai ficar tudo bem.
- Sim, já está melhorando, descanse um pouco... Vou cuidar dele.

Compartilhe:

DEIXE UM COMENTÁRIO

    Blogger Comment

0 comentários:

Postar um comentário