Kaname e Shiori #14


Aos poucos, Shiori abriu os olhos, observando o local a volta, e notou não haver nem sinal do carro que havia batido em ambos. Haviam capotado, porém nem sabia quantas vezes, afinal, não estava acordado. O céu, já tinha o leve tom azul, porém não tinha sinal do sol e agradeceu por isso, talvez inconsciente. Moveu-se com dificuldade, desprendendo o cinto  do local e gemeu, notando que havia dormido por apenas alguns minutos poucos, afinal a dor forte veio de uma das pernas, que certamente havia sido esmagada pelo carro na batida. Uniu as sobrancelhas e sentiu as lágrimas que escorreram pela face devido a dor que sentiu, quase inconscientemente, porém essa não era a prioridade no momento, tinha ferimentos pelo rosto, que não pareciam ser sérios, mas mesmo assim deixavam escapar uma boa quantidade de sangue. Desviou o olhar ao lado, procurando pelo outro, porém não o encontrou no banco e não se lembrava corretamente do que havia acontecido.

- K-Kaname... Kaname?
Falou baixo, tentou um tom mais alto em seguida, mas ninguém respondeu e por um minuto pensou que se havia se machucado tanto, o outro poderia estar pior se não estivesse morto e sentiu os olhos se encherem com as lágrimas ao cogitar a ideia.
Saiu do carro, como pôde a se arrastar para fora e nem quis olhar o ferimento na própria perna, assim seria melhor, pensou. Ergueu o corpo e observou o local, quase sem forças para fazê-lo, porém avisou o corpo a pouca distancia dali jogado ao chão, os cabelos morenos eram inconfundíveis.
Tentou se levantar, mas não podia e por um segundo fechou os olhos para suportar a dor que sentia dos ferimentos, sabia que logo ia passar, mas a dor do outro, não. Caminhou pelo local, como pôde, arrastando a perna ferida e o mais rápido que conseguiu e abaixou-se ao lado dele, praticamente a se deitar no chão e deslizou a mão pelos cabelos dele enquanto o observava.
- Kaname... Kaname por favor, acorda...
Murmurou já a deixar que as lágrimas escorressem pela face e desviou o olhar ao redor de si, procurando alguém ou alguma coisa, mas não encontrou nada. Retirou os cabelos que ele tinha sobre a face e tateou a roupa dele em busca do aparelho celular, não teve dificuldade em encontrá-lo, porém, estava quebrado. Uniu as sobrancelhas a tentar ligar o aparelho várias vezes e por fim desistiu a atirá-lo em direção a rua e o viu se partir em vários pedaços devido a força que tinha.
Abaixou a cabeça e repousou a face sobre o peito dele, porem não ouviu nada, ou talvez não soubesse mesmo encontrar o local exato, não era médico. Desviou o olhar para a face dele mais uma vez e aproximou-se a lhe selar os lábios, tocando seus lábios quentes, que agora estavam meio frios.
- Kaname... Não morra, por favor... Você tem que cuidar de mim... K-Kaname...
Novamente, abaixou a cabeça com a face em seu tórax e manteve-se imóvel, chorando em silêncio, abraçando-o com uma das mãos sem saber o que fazer, sem saber a quem chamar, não tinha ninguém, e ele também não. Alguém chamaria a ambulância, mas quando resgatassem o corpo morto dele do chão, também iria querer estar morto, o mundo sem ele para si, já não fazia mais sentido.
Ergueu a face um pequeno tempo após, e desviou o olhar ao pescoço dele, cessando o choro ao perceber que ainda havia uma chance, mínima que seja, de salvá-lo de alguma forma, porém, sabia que o outro podia odiar a si se o fizesse. Teria que decidir logo e não o deixaria morrer, não queria perdê-lo, não poderia perdê-lo, ele teria que perdoar a si mais cedo ou mais tarde, e caso fosse a vontade dele, iria embora, mas não poderia deixá-lo morrer ali, não naquele momento. Saber que ele estava vivo, para si, talvez fosse o suficiente.
Shiori se aproximou e beijou a pele do outro algumas vezes, abraçando-o enquanto aspirava o aroma de sangue, gostoso vindo de seu pescoço.
- Me perdoe...
Murmurou e se demorou algum tempo em sua pele, apreciando-a, acariciando o local onde machucaria, e sem pensar muito, cravou as presas na carne a novamente iniciar o choro fraco, lutando consigo mesmo se deveria ou não fazê-lo, sugando pouco do sangue do outro para si, suficiente para ajudar na cura dos ferimentos pelo corpo, e ao menos melhorar a própria perna a ponto de poder andar e carregá-lo consigo. Retirou as presas quando por fim satisfeito, aliás, não estava de fato, mas era suficiente por hora e uniu as sobrancelhas, erguendo o próprio pulso a levá-lo aos lábios e passou a presa afiada pela pele a abrir um pequeno corte, arrancando um pequeno gemido de si, dolorido, mas nada comparado a qualquer ferida. Guiou o próprio pulso ao pescoço dele, no local das fendas que havia feito e deixou que o líquido escorresse a cobrir as feridas com o próprio sangue.
- Calma... Eu vou te levar pra casa... Não me deixe sozinho, Kaname... Por favor...
O menor murmurou, mesmo sabendo que o outro não poderia ouvir a si e ergueu o corpo, levantando-se a sentir a dor quase insuportável pelo corpo e o carregou consigo, puxando-o para os braços e sentiu-se fraco demais para carregá-lo, porém, não desistiu de fazê-lo, mesmo que tivesse de parar algumas vezes e ajeitá-lo consigo, afinal era vampiro, mas estava machucado e era bem menor do que ele. Observou bem o local e guiou-se em passos calmos, porém rápidos como podia, afinal, estava amanhecendo e já podia sentir a dor na pele causada pelo pouco sol. Gemeu, fraco e seguiu pelo caminho na sombra até a casa que não era longe de onde estavam, mas todo o caminho, fora um inferno maior do que qualquer outra coisa que já havia sentido.
Ao chegar, passou pela recepção do apartamento, mesmo sem dar satisfações a ninguém, na verdade naquela hora, não havia ninguém na recepção a quem falar algo. Subiu até o andar onde moravam, se lembrava dos números embora quase desaparecessem junto com a própria consciência, e ao adentrar o apartamento ajoelhou-se no chão, agradecendo por estar em casa, observando o corpo dele junto do próprio. Beijou-o na face e levantou-se com dificuldade novamente, apoiando-se na perna dilacerada.
- Falta... Falta só mais um pouco...

Levantou-se e seguiu pelo corredor estreito que dava acesso aos quartos, levando-o consigo onde adentrou seu quarto e o colocou na cama, ajoelhando-se ao lado dele e o beijou na face algumas vezes, fazendo questão de notar se sua pele ainda estava quente.
- Eu... Preciso de sangue... Vou voltar pra cuidar de você... Vou sair só por uns minutinhos... Mas espere.
Devagar seguiu pelo corredor, apoiando-se na parede no caminho árduo até a cozinha e abriu a geladeira a buscar o líquido que o outro havia trazido para si, por sorte, tinha o suficiente. Bebeu alguns goles, sentando-se na cadeira próxima e sentia os próprios ferimentos se fechando aos poucos, observando a perna machucada que voltava para o lugar sem o mínimo esforço, embora dolorida e logo estava tudo bem, mas eram sequelas que jamais esqueceria, jamais esqueceria o que teve que fazer por ele, para salvá-lo ou matá-lo, dependendo do ponto de vista, mas não havia outro modo de mantê-lo consigo.
Shiori se levantou pouco tempo depois, seguindo o caminho de volta ao quarto dele, agora mais leve, e preparou a água morna num pequeno recipiente, limparia o outro do próprio sangue e dos resquícios do acidente, esperando que ele pudesse acordar e que o tivesse salvado há tempo, esperando que pudesse ver seus olhos bonitos de novo, ouvir sua voz, quase cantada aos ouvidos e sentir sua pele, já não mais tão quente quanto antes.

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