Kazuma e Asahi #20


A igreja estava mais calma naquela noite, todos já haviam ido para a cama cedo e Asahi, estava sentado num dos bancos, pensando no que havia se tornado, também pensava em como seria maravilhoso se o visse entrar por aquela porta, desde aquele dia não havia voltado e sentia sua falta, apesar de não parecer. Suspirou e levantou-se, seguindo para o andar de cima onde cobriu o corpo, que estava sem a batina, apenas com a camisa e calça, por um manto preto, cobrindo até a cabeça e logo saiu da igreja, não precisava de um carro, se viraria. Os guardas na frente, haviam se retirado por um tempo, o que fora bom para que pudesse passar e logo, fora caminhando pela rua, embora tentasse andar nas sombras. A cidade era praticamente escombros jogados, então podia ver a base ao longe, iria até lá.
Passou por alguns soldados parados ali, por sorte, não eram inimigos e nem viram a si. Logo se fazia em frente aos portões e como os soldados iam e voltaram durante a noite, conseguiu um espaço para que pulasse o muro, embora depois que já estivesse dentro, achasse isso um pouco de idiotice, já que quase 
havia se quebrado inteiro. Seguiu em direção ao alojamento dele, já conhecia, só não sabia como iria adentrar. Suspirou, observando a porta sempre vigiada por soldados e por fim, ouviu o barulho da porta, um soldado havia saído aparentemente, mas era diferente, tinha os cabelos curtos e raspados, e claro, o conhecia de longe. Principalmente pela falta do quepe na cabeça. Sorriu e aproximou-se por trás, antes que algum soldado visse a si, por sorte, ele havia caminhado a distância para fumar um cigarro, e estava nas sombras esperando.
- Psiu.

Asahi fechou a porta atrás das costas, puxando o batente a deixar para trás o próprio alojamento alguns metros de distância, suficiente para estar sozinho, suficiente para um cigarro sem acompanhante. Tirou o fumo do bolso do uniforme militar que vestia, levou o pequeno cilindro de cor escura até os lábios e acendeu a ponta em brasa, o qual proveu os pulmões de um longo e intoxicante trago. A noite estava calma, o tempo estava bom, não tinha chuva, frio ou calor, era só um tempo bom para se sentir na pele, muito melhor para senti-lo sem algum ataque ou defesa. Podia sentir no rosto um vento estável, não era forte, mas era demasiado fresco. Havia enviado os mantimentos à igreja, ainda que houvesse estado ocupado demais nos últimos dias, e aquele era um dia bom para ter ido até lá, mas não iria, já havia mandado o que precisava, não tinha motivos para ir até lá, não iria como um mero militar procurando um buraco para enfiar o pau, mas talvez devesse saber se eles estavam bem, o que fora constado pelas palavras do soldado responsável pela entrega, logo, seria inútil indo até lá. Fitou-de soslaio a base atrás de si, os soldados distantes, sentindo-se acompanhado ainda que não fosse visto, bom, era comum, talvez houvessem muitas vidas tiradas e perdidas por lá. Mas certamente o ruído não vinha de alguma alma penada, senão de um monte num manto preto que causou um leve arqueio na sobrancelha.
- Mas que porra...

Asahi sorriu ao notá-lo se assustar, não queria fazê-lo, mas pareceu enraçado na hora, o problema fora que ele já estava levando a mão à arma presa na cintura e negativou, unindo as sobrancelhas e caminhou em direção a luz rapidamente, retirando o manto preto dos cabelos a deixar a face a mostra para ele.
- Não atire!

Kazuma levou a mão até a cintura, na arma portada no coldre e no movimento hábil do rapaz, o mesmo fizera ao erguer a mão e mirar em sua direção que no entanto logo afrouxou e tornou abaixar.
- Enlouqueceu, Padre?!

- Iie, eu vim te ver. - Uniu as sobrancelhas. - Desculpe pelo susto.
- Não me assustou, só ia morrer por ser alguém encapuzado no escuro.
- Eu imaginei. - Murmurou e abaixou a cabeça, logo desviando o olhar a ele. - Por que não veio me ver?
- Como entrou aqui? - Retrucou no entanto, cruzando sua própria pergunta. 
- Eu pulei o muro... É uma longa história. Seus soldados estavam dormindo no portão.
- Poderia ter sido morto no caminho até aqui. O quão irresponsável você pode ser, Padre?
O moreno indagou e o pegou pelo braço. Jogou o cigarro num canto qualquer em algum momento que não soube qual era, levando-o caminho ao próprio dormitório, onde passou pelos soldados em guarda, que sem perguntas dera passagem suficiente para colocá-lo para dentro. Asahi u
niu as sobrancelhas ao ouvi-lo e seguiu com ele para dentro do local, observando o próprio braço segurado e dolorido devido ao puxão.
- Itai...

Kazuma soltou somente quando o colocara dentro do próprio escritório, onde daria passagem aos demais cômodos de lá, onde ele já havia conhecido antes, mas não tinha certeza.
- Não devia ter vindo, por que não esperou?

- Ai... - Murmurou e segurou o pulso, apertando-o entre os dedos. - ... Porque senti sua falta.
O moreno fitou o menor, realmente parecia um garoto apaixonado, mas era contraditório demais, talvez ele mesmo não entendesse o que fazia. Asahi desviou o olhar, sabia que estava errado, mas precisava vê-lo, saber se estava bem, e talvez fosse um tolo por fazê-lo.
- Vou embora... Já constei o que queria.

- Não seja tolo. Você pode ficar, mas não saia a essa hora, poderia ter sido morto lá fora. Poderia ter sido morto por mim.
- Ninguém se importa, Kazuma.
- O que, a guerra está te pondo em depressão?
- Não, estou constando o óbvio. 
Quem se importaria com um clérigo numa igreja abandonada no meio do nada?
- Ora, o quão crente em Deus você é, Padre? Está perdendo sua fé? As pessoas daquele lugar não vivem com você?
O loiro suspirou, e de fato, estava perdendo a fé, mas não diria a ele.
- Vamos, talvez esteja um pouco de cabeça quente. Você pode ficar por aqui por hora.

- IieVou embora.
Por quê?
- Porque sim, você não liga.
- Se não ligasse não te daria sermão sobre sua saída irresponsável.
- Hum. - Falou a observá-lo. - Você se quer vai me ver.
Eu vou quando posso, Asahi. Preciso cuidar de muitas coisas, não posso me dar ao luxo de ficar indo fazer visitas.
O menor uniu as sobrancelhas e assentiu.
- Vamos, tire esse seu capuz estranho.
O loiro assentiu e logo se desfez do manto, deixando ao lado.
- Quer beber alguma coisa, Padre?
- Por favor.
- Vinho, uísque, água?
- Vinho, por favor.
 Embora surpreso pelo pedido, Kazuma não esboçou. Seguiu até a pequena copa onde serviu ao religioso a taça com o vinho tinto que levou a ele onde se acomodou por hora.
- Fique à vontade.
- Hai. Com licença. - Falou e sentou-se logo no sofá, recebendo o vinho e bebeu um gole. - Hum, oishi.

O moreno serviu-se numa igual dose e se sentou noutra poltrona, observando o rapaz.
- Como tem passado, Padre?

- Bem. Me sentindo meio estranho desde aquele dia.
- Estranho como?

- Meio frustrado, com medo de morrer.
- Não acredita mais nos planos de Deus, Asahi?
- Acreditar ou não, não me faz ter menos medo de morrer. - Disse e bebeu alguns goles de vinho. - Agora sei que não vou pro céu.
- Numa de nossas primeiras conversas disse que não temia a morte.

- Pois agora, que eu sei que vou direto para o inferno eu temo.
- Deus não é perdão?

- Acha que ele perdoaria um padre que fez seus votos e se deita com outro homem?
- Você realmente não serve para ser um padre, Asahi.
Kazuma disse e deu um único trago que esgotou o vinho da taça, e que deixou de lado, sobre a mesa do escritório deixou o recipiente vazio e caminhou ao louro, segurou-o pelos braços a o fez se levantar.
- Vamos, tome um banho, deite-se. Pode pernoitar por aqui.

O loiro bebeu mais alguns goles do vinho, porém, fora forçado a deixá-lo de lado ao senti-lo puxar a si.
- Ah... C-Calma...

- Estou calmo.
O moreno retrucou e deu uma apertadinha em seus ombros, onde o segurava. O loiro u
niu as sobrancelhas e sentiu um arrepio percorrer o corpo, não sabia se tinha medo dele ou se sentia atração.
- Eu... Temo estar perdendo a fé, Kazuma...

- Não está aqui para falar de fé, não é?
Asahi negativou, embora tivesse lágrimas nos olhos.
- Então banhe-se, vai saber que estou aqui, vai poder dormir longe da sua realidade atual, embora eu não garanta que não vá ouvir alguma explosão tão logo.
O loiro sorriu meio de canto e assentiu, aproximando-se dele e lhe selou os lábios. Uma das mãos, tomou a dele e entrelaçou os dedos aos do outro, nunca pensou que ficaria assim tão perto de um homem, de qualquer outra pessoa na verdade, mas se sentia a salvo com ele.
Kazuma sentiu seu leve beijo, superficial e ingênuo como era habitual, ou talvez não fosse tão ingênuo como imaginava. Sentiu o toque de sua pequena mão, não demasiado pequena, mas era menor do que a própria, e ao dedilhar seus dedos pelo desvencilho do contato, levou os braços em torno de seus ombros, o abraçou, num gesto deveras atípico, porém pensava que aquele simples gesto talvez tirasse toda sua melancolia.
Asahi sentiu o abraço dele ao redor do corpo e arregalou os olhos por um instante, de fato era estranho mesmo, mas tão confortável que não pôde reclamar. Aconchegou-se ao peito dele e fechou os olhos por um pequeno tempo, apreciando o abraço.
O moreno sentiu seu aninhar entre os braços, confortando-se com o que ganhava. O permitiu algum tempo por lá, talvez pudesse faze-lo esquecer o que vira alguns dias atrás. O menor suspirou, nunca havia sido abraçado, nunca havia tido aquele conforto que os outros homens tinham, e estar ali com ele era tudo para si. Permaneceu por vários minutos daquela forma e ao invés de soltá-lo, ergueu a face, observando-o. Kazuma voltou-se para baixo a fitá-lo.
- Se sente melhor?

- Hai... Obrigado.
- Vá para o banho, fique algum tempo.
Hai... Aqui mesmo?

- Em meu quarto tem o banheiro. Você já sabe o caminho.
-Ta bem.

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