Kazuma e Asahi #7


Asahi havia terminado as orações, o dia estava calmo embora ouvisse as crianças correndo de um lado para o outro na igreja a fazer suas travessuras, se não quebrassem nada, estava tudo certo. O problema, é que estava silencioso demais, e sabia que quando estava assim, alguma coisa ia acontecer. Já fazia uma semana desde que o vira pela última vez e nem sinal dele após isso, nem o vira passar na frente. Chegou a pensar que talvez, ele só quisesse fazer aquilo consigo mesmo e nada mais.
Voltou-se em direção à torre do sino e apoiou as mãos no parapeito, observando o local, tranquilo do lado de fora, sem muito alvoroço e até jurou poder ouvir alguns pássaros cantando no local. Os guardas na porta da igreja, protegiam os refugiados, não haviam problemas e por um momento, descansou ali, sobressaltando-se apenas ao ouvir o som de um trovão meio forte soar sobre a própria cabeça. Uma semana sem chuva e agora voltava, como na noite em que havia se deitado com ele. Suspirou, por que não conseguia tirar aquele maldito da cabeça? Ele não havia voltado, então? Era padre, havia feito votos, não 
podia se deixar levar por um sorriso bonito. Iria chover, portanto precisava avisar que se preparassem para qualquer problema e virou-se para se voltar ao andar de baixo, quando ouviu o som que de início baixo, mas aos poucos aumentou como um estrondo, algo havia explodido. Virou-se rapidamente, observando o local do lado de baixo e arregalou os olhos, não enxergava nada devido à poeira, mas parecia ter sido bem próximo dos alojamentos militares.
- Não...
Falou, mais para si mesmo e sentiu o nó na garganta, um certo aperto no peito de mesmo modo e desceu rapidamente as escadas, correndo pelos corredores em direção à porta e quando fizera menção de sair, fora agarrado pelo pulso.

- Padre, não pode ir lá fora!
- Eu preciso ajudar! Ele... Eles... A bomba!
- Padre! Por favor, Kazuma pediu que não saíssemos por nada, não se lembra?
- Me solte! Hana! Me deixe sair! 
- Padre!
Fora somente um grito e o tapa estalou contra a face, não sentia dor, mas fora  o suficiente para acordar a si dos sentimentos conturbados devido à explosão da bomba. Assentiu para a enfermeira chefe, desviando o olhar e ainda sentia o coração acelerado, teria de esperar... Teria de sentar e esperar! Ora, para o inferno com aquelas malditas regras! Suspirou, uma, duas vezes e agarrou o crucifixo no pescoço, desviando o olhar em direção à porta e por hora permaneceu ali, na verdade, por horas. A chuva já batia sobre o telhado quando se sentou no banco da igreja, em frente à porta, e ainda agarrava firmemente ao acessório de madeira, rezando, vezes em silêncio, vezes murmurando algo e não havia quem tirasse a si dali.
- Senhor... Precisa descansar.
- Estou esperando.
- Esperando o que?
- Preciso saber se ele está bem.
- Quem, padre?
- Kazuma.
- Eh?
- Suprimentos.... Vamos... Vamos ficar sem suprimentos se algo acontecer com ele.
- Se acalme padre, vamos dar um jeito.
- Estou calmo, só estou rezando... Logo vou descansar. 
- ... Certo.
Kazuma não tivera tempo de comparecer à igreja nos últimos dias. Embora o tempo estivesse calmo naquele dia, não tinham tipicamente muitas horas vagas, havia até mesmo encarregado um dos soldados para levar as pessoas que precisassem até o abrigo mais seguro que tinham lá, a igreja. Algumas crianças, uma jovem de dezesseis anos que fugia pela bagunça a tempos de ser pega por algum soldado, era a mais velha que já havia conseguido mandar para a igreja, preferia dar atenção aos idosos e as crianças, dando um futuro aos que ainda conseguiriam um e dando sossego aos que pouco estariam por lá, não costumava ter piedade dos mais capacitados. Entrou na base e pôde finalmente descansar após alguns dias, tirou o quepe e teve de jogar os cabelos atrás, tirando o pouco suor da raiz dos fios escuros. Sentou-se na poltrona atrás da mesa onde alguns documentos ainda precisavam ser revisados, embora não tivesse cabeça para isso naquele momento. Alguns homens haviam sido enviados para enfermaria, feridos, descuidados, malditos fossem e não tinha saco para cuidar da vida de ninguém. Sentia tanta tranquilidade que podia até mesmo ouvir murmúrios de conversas breves e pacíficas, passos pelo solo que não eram realmente uma marcha, tudo parecia tão tranquilo que era incomum. Fechou os olhos ao recostar a nuca na poltrona e teve um momento despreocupado, quase sentia o sono chegar, não dormia há dias, mas o estrondo interrompeu a calmaria e levantou-se tão de repente que pareceu pular, uma das bases havia sido atingida e aquilo era um sinal de que teria mais algum tempo de dor de cabeça. O que antes eram leves passos pelos destroços, agora se tornavam correria sobre novos pedaços de chão fora do lugar.
Cabisbaixo, Asahi permaneceu ali até escurecer. Eram três das manhã e ainda não havia dormido. As enfermeiras, todas já haviam seguido a seus dormitórios e para si era melhor daquele modo, não incomodariam a si, fora quando cochilou. No sonho, via um extenso jardim se cobrir de fumaça, como se algo estivesse extremamente errado e provavelmente era por causa daquela preocupação crescente com o rapaz que havia ajudado a si tão gentilmente, e nem suspeitava que pudesse ter segundas intenções para com ele. Na verdade, pensou nesse caso, mas preferiu acreditar que pudesse ser apenas afeição a sua bondade, ignorando o que haviam feito, e preferia mesmo ignorar, se alguém além da outra enfermeira soubesse, seria excomungado da igreja assim que a guerra acabasse.
Os soldados bateram contra a porta da igreja, embora somente um deles houvesse sido autorizado a cruzar o portão principal que daria vazão ao extenso terreno da grande arquitetura inafetada. Levava consigo duas idosas recolhidas entre seus cinzentos cobertores, não por sua cor natural, mas por toda aquela poeira. Consigo seguiam duas crianças e uma jovem garota. Ao baterem brandiram em espera por serem apressadamente atendidos diante da demora do recebimento nos portões, já era um pouco mais de quatro e quarenta da manhã, lá fora ainda tinha um pequeno alarde, ainda que não fosse escandaloso, silenciosamente cuidavam do problema causado na base militar.
- Padre!
Dizia o soldado ao forçar a entrada na igreja assim que a enfermeira se colocava posta mais prontificada que o religioso.
- Onde está o maldito homem?! Pegue-os, temos trabalho!
Retrucou ao colocar as crianças para dentro, assim como a jovem e os idosos.
- Eh? Eh?
O loiro se levantou rapidamente ao fitar a porta, notando a gritaria no local e ajeitou a batina, e claro, esperou que fosse o general, mas não era, ao menos era um soldado e poderia perguntar sobre o outro para ele. Correu em direção à porta, acolhendo as pessoas que ali estavam, mesmo com a vista meio embaçada e logo segurou o soldado pelo braço, embora brandasse algo qualquer com uma das mãos.
- Rapaz! Kazuma, onde ele está?!

- Kazuma?
Disse-lhe o soldado ao ser parado e embora não fosse estúpido como soldados de outro grupo, evidentemente era desgostoso do modo desrespeitoso do homem religioso ao se dirigir ao superior.
- Senhor Sakurai está ocupado, não pôde vir.
- ... Hai... Senhor Sakurai... - Asahi falou a ele, e agradeceu por não ter levado outro soco, embora não doesse, certamente ficaria atordoado. - ... Então está tudo bem com ele?

- Não é dos melhores dias. Fiquem aí dentro.
Retrucou o rapaz, não deixando claro os problemas ou não, da base militar.
Iie... Iie, hey, ele se feriu? Ele está bem?!
- Não está ferido, não atingiram o alojamento dele.
Disse ele rapidamente a se retirar e desvencilhar da investida do padre, achando a atenção esquisita, ordenava que todos entrassem e se fechassem na igreja, assim como instruído pelo superior antes da partida.
- Se preocupe com vocês mesmos.

Asahi uniu as sobrancelhas e assentiu, logo adentrando a igreja a fechar a porta e suspirou, ao menos ele não estava machucado. Soltou o crucifixo, que quase se cravava à mão e desviou o olhar para a enfermeira, a pouca distância, caminhando até ela a parar em seu lado.
- Tudo bem, Emi... Pode acomodá-los por favor?

- O senhor estava esperando por ele, não é?
- Ele quem?
- Sakurai.
- ... Iie, ora, por que eu estaria esperando ele? Vá, acomode os novos hospedes.

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